Ainda há pouco tempo, por esta altura, meados de Julho, uma parte dos portugueses iniciava o ritual de Verão - uma espécie de "encerrado para férias". A "classe política" e adjacentes preparavam-se para ir a banhos, cada ministro ou dirigente partidário informava a comunicação social se ia para a praia da Coelha, dos Tomates ou da Manta Rota, onde aguardava ansiosamente que um jornalista o "apanhasse" em calções de banho. Aí, já bronzeados, davam entrevistas, falavam descontraidamente sobre os seus "hábitos de férias" ou da "importância do descanso com a família" e, alguns, não perdihttp://www.blogger.com/img/blank.gifam a oportunidade de aparecer naquelas festas manhosas frequentadas por "empresários" e "gente famosa" - o nosso "jet set" pelintra. O Parlamento encerrava portas por mais de dois meses, enquanto os gabinetes ministeriais apenas asseguravam os "serviços mínimos". Era assim a bitola do país, e ninguém lhes levava a mal a despreocupação e a ligeireza, e muitas vezes, porque não dizê--lo, a pirosice, até porque uma "classe média" em ascensão, essa, com ordenado certo e as prestações em dia, a quem os bancos batiam à porta com crédito para tudo e para nada, com conversa de amigos – não se preocupe, só paga quando puder -, para além do Algarve, enchia os voos fretados para o Brasil, República Dominicana, Cuba, Cancun ou, para os mais ousados, para a Tailândia. Outros hábitos estavam enraizados, como por exemplo, fazer "contas à vida" e comprar uma casa de férias ou um carro novo, com o mesmo à vontade com que, há três ou quatro gerações atrás, se ia comprar caramelos a Badajoz ou a Ayamonte.
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Este ano a “silly season”, no Algarve, não vai ser o que foi nos anos “dourados” do dinheiro a rodos
Ainda há pouco tempo, por esta altura, meados de Julho, uma parte dos portugueses iniciava o ritual de Verão - uma espécie de "encerrado para férias". A "classe política" e adjacentes preparavam-se para ir a banhos, cada ministro ou dirigente partidário informava a comunicação social se ia para a praia da Coelha, dos Tomates ou da Manta Rota, onde aguardava ansiosamente que um jornalista o "apanhasse" em calções de banho. Aí, já bronzeados, davam entrevistas, falavam descontraidamente sobre os seus "hábitos de férias" ou da "importância do descanso com a família" e, alguns, não perdihttp://www.blogger.com/img/blank.gifam a oportunidade de aparecer naquelas festas manhosas frequentadas por "empresários" e "gente famosa" - o nosso "jet set" pelintra. O Parlamento encerrava portas por mais de dois meses, enquanto os gabinetes ministeriais apenas asseguravam os "serviços mínimos". Era assim a bitola do país, e ninguém lhes levava a mal a despreocupação e a ligeireza, e muitas vezes, porque não dizê--lo, a pirosice, até porque uma "classe média" em ascensão, essa, com ordenado certo e as prestações em dia, a quem os bancos batiam à porta com crédito para tudo e para nada, com conversa de amigos – não se preocupe, só paga quando puder -, para além do Algarve, enchia os voos fretados para o Brasil, República Dominicana, Cuba, Cancun ou, para os mais ousados, para a Tailândia. Outros hábitos estavam enraizados, como por exemplo, fazer "contas à vida" e comprar uma casa de férias ou um carro novo, com o mesmo à vontade com que, há três ou quatro gerações atrás, se ia comprar caramelos a Badajoz ou a Ayamonte.
terça-feira, 10 de julho de 2012
O fim do parque de estacionamento de Armação de Pêra
segunda-feira, 9 de julho de 2012
Indecência certificada

por FERNANDA CÂNCIO06 Julho 2012
Ao contrário do que nos dizem os clássicos infantis, não há em regra moral na história. É assim que podemos assistir, boquiabertos - como anteontem - a um Santana Lopes, na TVI24, a perorar, a propósito do curso de Relvas, sobre deverem ser os políticos julgados pelos seus atos em funções e não por episódios do seu percurso privado (cito de memória), sem que algum dos presentes, de Constança Cunha e Sá a Assis e Rosas, pigarreasse sequer. Que o homem que nas legislativas de 2005 fez insinuações explícitas sobre a orientação sexual do adversário e exigiu a audição do depois primeiro-ministro no Parlamento sobre a respetiva licenciatura possa, sem lhe cair tudo em cima, afetar lições de fineza e elevação é bem elucidativo, não apenas da sua comprovada desvergonha, como da amnésia amoral da audiência.
De vez em quando, porém, a realidade faz-se fábula de La Fontaine. E vemos então alguém como Miguel Relvas, que em abril de 2009 afirmou "se fosse parente do engenheiro Sócrates escondia que era parente dele", acrescentando "depois de ganhar as eleições todos os dias quero que a minha filha tenha orgulho" a, numa audiência parlamentar do caso das secretas, três anos depois, lamentar--se, olhos e voz tremeluzentes, pelo "muito que custa" e "o tão injusto é" ser julgado na praça pública, concluindo: "Todo o cidadão tem direito ao bom nome; [...] tenho família, tenho amigos, tenho uma posição na sociedade..."
Tem Miguel Relvas toda a razão: todo o cidadão tem direito ao bom nome. Até ele, que o negou a outros. Curioso que só se dê disso conta quando é à sua porta que as acusações e insinuações batem, depois de tudo ter feito, como tantos "notáveis" do seu partido, de Santana a Ferreira Leite, de Marques Mendes a Menezes, de Pacheco Pereira a Passos, para que a doença do ad hominismo infetasse o combate político, banalizando as considerações sobre "o carácter", o percurso académico e até a família dos adversários.
Estamos a falar do partido cujo líder Marques Mendes pediu, em 2007, uma comissão independente para investigar a licenciatura de Sócrates (o qual, recorde-se, fez cinco anos de Engenharia em universidades públicas); que exigiu uma audição da ministra Lurdes Rodrigues para explicar a suspensão de um funcionário por supostamente ter feito uma piada insultuosa sobre o diploma do então PM, considerando, a priori, estar ante "uma atitude intimidatória, persecutória e opressora dos mais elementares direitos, liberdades e garantias." Um partido, enfim, especializado na calúnia, no insulto e na perseguição pessoal, cujo grupo parlamentar rejubila com menções "a licenciados de domingo" ou "discursos encomendados em cafés de Paris".
Num tal partido, a revelação da licenciatura "Novas Oportunidades" (ah, a suprema ironia - "certificação da ignorância", não era, senhor primeiro-ministro?) de Relvas deveria ter o efeito de uma bomba de tinta negra - tudo com a cara pintada de preto. Isto, claro, se face houvesse
domingo, 8 de julho de 2012
sábado, 7 de julho de 2012
sexta-feira, 6 de julho de 2012
quinta-feira, 5 de julho de 2012
Praia Grande:Eles não sabem que para a história não restarão dúvidas!
Ainda estávamos a uns bons meses de conhecer a “Bolha do Imobiliário Americano” e as suas consequências imediatas. Mais longe nos encontrávamos das suas consequências mediatas e encadeadas até ao dia de hoje sem que se vislumbrem seriamente perspectivas de virem a finar-se, se o Ocidente, tal como o conhecemos, não se finar ele próprio, antes, ou em comoriência.
Em Silves, em mais uma rotineira sessão de Câmara decidia-se, entre outras minudências, o PLANO DE PORMENOR DA PRAIA GRANDE – SUNOP II -.
Estávamos em Portugal, neste quedo remanso, onde já despontavam evidências da premência das necessidades do Orçamento Geral do Estado quanto à receita, através da agressividade fiscal com as garras bem à mostra de toda a gente, mas ainda travestidas de mera eficiência na cobrança.
O mal já lá estava e nós não o víamos!
Nem todos! O Prof. Hernâni Lopes, na segunda metade da década de 90 já avisava os construtores civis que lhe pagaram o estudo encomendado que, no ano 2000 a Procura e a Oferta de habitação se encontrariam, restando daí em diante a recuperação de imóveis para a actividade da construção, que compreensivelmente se reduzia enormemente.
Sabemos hoje, quais profectas do passado, não só que a actividade da construção de habitação continuou desenfreada como se nada fosse, como também que as projecções do saudoso professor estavam certas!
A eloquência da competência das elites empresariais nacionais do sector só se poderá, algum dia ver distinguida com uma licenciatura numa Universidade do tipo Lusófona e segundo o processo de Palermo. Disso não restam, hoje, dúvidas!
Enquanto isto, retomando Silves, a Câmara, isolada do mundo, mas bem ciente das certezas que só os ignorantes podem ter, reunia em sessão extraordinária, para decidir sobre aquele Plano da Praia Grande.
Para um leigo, ficou para a história, que a decisão foi precedida de várias intervenções, que deram origem a outros tantos excertos escritos das mesmas.
A sessão deu-se e a oposição esperneou!
Aquele Plano foi aprovado por maioria com dois votos contra do PS e uma abstenção do Vereador Manuel Ramos.
A base informativa sobre a qual a Vereação se pronunciou foi claramente escassa e o conhecimento evidenciado sobre a matéria sobre a qual os senhores Vereadores vieram a votar, mais escasso ainda.
Poderão, se forem intelectualmente desonestos, dizer que tanto fazia estudar o dossier detalhadamente ou não fazê-lo, que daria no mesmo face à maioria do PSD, o Plano seria sempre aprovado!
Só que por essa lógica, quem neles votou para se ver representado na Câmara, só deveria votar depois de saber quem seria o partido mais votado, uma vez que daria no mesmo votar neles (minoria) ou não, já que a maioria seria a mesma!
Neste último caso, compreende-se imediatamente o ridículo que constituiria tal comportamento eleitoral, porquanto tal conhecimento “antecipado” do resultado eleitoral só é possível postecipadamente, quando já nada há a fazer!
Já no caso antecedente, embora por outro caminho, sucede o mesmo! Senão vejamos:
Um plano de pormenor que abrange e, ou, interfere com uma Reserva Ecológica Nacional, de duas uma:
- Ou justifica uma extrema atenção e um aturado estudo (o qual não tem de ser feito necessariamente pelos Vereadores, devendo estes no entanto, na altura certa, que é antes da própria sessão, conhecer ao detalhe os seus pontos fortes e pontos fracos, uma vez que se trata de uma Reserva Ecológica Nacional, com todo o peso que, hoje em dia e já em 2007, as questões ambientais têm para a sustentabilidade do Planeta),
- Ou não se justifica termos na Câmara alguém a quem os contribuintes pagam para estar atento aos assuntos relevantes consagrando as horas necessárias ao seu estudo adequado à importância que representem, por forma a que, sendo caso disso, mobilizem os cidadãos sobre as suas debilidades e, ou, consequências não acauteladas, motivando a discussão pública e participada das populações.
Os senhores Veradores resolvem bem estes problemas votando CONTRA ou ABSTENDO-SE, sobretudo quando sabem que o seu conhecimento limitado das matérias em questão, ou o muito pouco trabalho dado ao assunto, fica muito bem branqueado pela existência de uma MAIORIA que será sempre a “culpada” da decisão!
A asneira não é, deste modo, sua!
E assim aqui chegámos e por aqui parece continuarmos!
A história far-lhes-á justiça, condenando-os! Disso não restam dúvidas!
quarta-feira, 4 de julho de 2012
terça-feira, 3 de julho de 2012
segunda-feira, 2 de julho de 2012
Deus queira que sejam mentirosos, pois parecem ignorantes!
Os credores e parceiros da União têm aplaudido a coragem das medidas tomadas e o esforço dos contribuintes portugueses na sujeição às mesmas, sem contestação significativa.
Demorou um pouco aos menos informados, compreender a estratégia do Governo face à situação complexa que o pais vive, e o futuro que a mesma visa.
Não nos preocupando em fazer ressaltar as incongruências constatadas, entre o que foi sendo dito e o que foi sendo feito, lugar comum ao commentariat nacional, consideramos que a situação de emergência que o pais vive não se compadece com minudências. Sim minudências, uma vez que enquanto procuramos encontrá-las, depois de encontrá-las constatamos da sua total inconsequência, esgotando-se a descoberta em si mesma.
Todos se lembrarão do snr. Passos Coelho em campanha eleitoral garantir que não iria aumentar as taxas do irs.
E todos sabem que aquelas taxas foram aumentadas!
E daí? O que sucedeu?
Nada!
Por conseguinte, detectar mentiras ou ignorância, não só é absolutamente inconsequente, como, de entre elas, ainda rezamos pelas primeiras, com justo receio de estarmos nas mãos da segunda!
Na verdade, perante a situação económica e financeira do pais e as medidas tomadas para lhes fazerem face e sobretudo diante dos resultados obtidos decorrido um ano, vemo-nos conformados a considerar mais tolerável a mentira que a ignorância.
“...um Governo que calculou que o IVA ia crescer 11,6% e está confrontado com uma descida de 2,8% até Maio; com uma quebra nos impostos sobre veículos que estava prevista ser de 6,5% e já vai em 47%(!); com um recuo esperado de 2,1% no imposto sobre os produtos petrolíferos, que ascende já a 8,4%; com um aumento no subsidio de desemprego de 23%, quando o Executivo apontava para 3,8%; e com uma quebra nas contribuições dos trabalhadores e empresas para a ssegurança social de 3% quando se esperava apenas 1% - o que se pode dizer se não que se trata de um falhanço verdadeiramente colossal da equipa das Finanças e, em particular, do brilhantíssimo e competentíssimo ministro Vítor Gaspar?” Nicolau Santos, in Expresso de 30.06.12.
Nicolau Santos, parece não ter qualquer duvida significativa, trata-se de ignorância!
Nós preferimos considerar que tais responsáveis foram mentirosos!
Porquê? porque um politico mentiroso tem, boa ou má, pequena, média ou grande, uma estratégia e um objectivo em vista, subentendendo-se que acompanhados de uma avaliação de riscos e independentemente de estarmos ou não em sintonia com o resultado que pretendem atingir, ao passo que um politico ignorante não pode avaliar o risco de não saber por onde caminha, em direcção a um destino que desconhece...
Mentirosos ou ignorantes os cidadãos com a responsabilidade do poder nestas áreas especificas, quer pertençam ao grupo dos primeiros, quer sejam dignos representantes dos segundos, não servem a comunidade, o pais ou o futuro e por isso deviam demitir-se. Já que, por meios constitucionais, não os podemos afastar no imediato.
O respeito não se dá a ninguém! Conquista-se!
Temos a noção de que a gravidade da situação económica e financeira nos obriga a uma politica ortodoxa de cumprimento, uma das poucas vias de um devedor conquistar o respeito dos seus credores.
O respeito dos credores é condição essencial para obter mais crédito, sobretudo quando o devedor tem pouco mais que seriedade.
Esta tem sido a estratégia do Governo. Ser cumpridor, a qualquer custo, para ganhar o estatuto respeitável de cumpridor e com este estatuto obter mais crédito e quem sabe, melhores condições de juros e prazo pagamento pagamento.
Na ânsia de preencher os pressupostos definidos pelos credores acerca do que é ser um pecador (devedor) da luxúria e de como se deve redimir, o Governo não só cumpre todos os maneirismos do arrependido (vide o famoso momento de Vítor Gaspar com o ministro das finanças alemão) como inflige à comunidade dos pecadores que dirige toda a sorte de castigos que a autoridade credora gostaria de ver infligidos, até para evidenciar à exaustão o rigor da punição.

Mesmo apesar do menino Galp do: “11 por todos, todos por 11”, versão publicitária de todos aqueles que sempre consideraram o seu povo como uma piolheira, ainda achamos que não é a partir dessa vertente que se encontrarão as razões da nossa triste sina.
Quem assim age desconhece que, se tivesse mantido as taxas do IVA, para além de ter contribuído significativamente para a resistência das empresas à crise, ainda teria sido premiado em sede de receita com mais 2,8% do que encaixou até Maio.
Quem se dá à ignomínia de nos considerar preguiçosos desconhece que, apesar da competência de quem nos dirige em qualquer nível da actividade pública ou privada, resistimos como poucos a tanta ignorância, ineficiência, deslealdade, falta de visão prospectiva, estupidez e total ausência de estratégia nacional.
Quem se propõe reformar o que há por reformar e se limita a mascarar o velho de novo, querendo fazer acreditar que o velho é na verdade novo, todos esses sim, são a piolheira de que não conseguimos livrar-nos e disso, nada temos por que nos orgulhar.
domingo, 1 de julho de 2012
sábado, 30 de junho de 2012
sexta-feira, 29 de junho de 2012
O TOQUE FEMININO

Aviso de antemão que esta crónica pode perturbar almas sensíveis, pelo que não é recomendável àquelas e àqueles que, na senda de Edite Estrela, acreditam tão piamente que “haverá mais paz no mundo com mais mulheres em altos cargos políticos” quanto as as senhoras do MNF tinham a crença inabalável no slogan “Angola é nossa!” Começo por uma adivinha: o que têm em comum Margaret Thatcher, Angela Merkel e Christine Lagarde? Em 1º lugar, são mulheres; em 2º lugar, têm poder; em 3º lugar, são reacionárias, se me é permitido ainda usar o termo. Recorde-se que Thatcher, autora do “no such thing as society”, é, das gtrês, embora retirada, a única com pensamento politico
articulado. Merkel limita-se a empurrar(-nos)com a barriga e Lagarde administra dinheiro alheio enquanto nos ameaça com a antiquíssima tirada de Paul Fével, “Si tu ne viens pas à Lagardère, Lagardère ira à toi!”

Entrevejo já algumas das almas sensíveis – femininas, masculinas e/ou “transgéneras” – correndo a diagnosticar-me o mal da misoginia, versão
jewish self-hatred adaptada “ao segundo sexo”. Antes que me condenem a ler de fio a pavio o livro de Cavalcanti Filho onde a “putativa homossexualidade” de Pessoa terá sido finalmente revelada, invoco em minha defesa:onde está o feminine touch de Merkel quando o Ministério da Economia do seu governo chega a propor, como solução para a crise, a formação de “zonas económicas especiais”, variante update do modelo esclavagista em exercício na China? E que dizer das declarações de Lagarde (logo ela que, enquanto funcionária internacional do FMI, não paga impostos) sobre gregos e pretinhos esfomeados do Níger que lhe partem o coração? Desculpem-me o fr
ancês: feminine touch, my ass.
quinta-feira, 28 de junho de 2012
quarta-feira, 27 de junho de 2012
Nação valente e imortal
Deixam de ser ministros e a sua vida um horror, suportado em estóico silêncio.
Veja-se, por exemplo, o senhor Mexia, o senhor Dias Loureiro, o senhor Jorge Coelho, coitados. Não há um único que não esteja na franja da miséria. Um único. Mais aqueles rapazes generosos, que, não sendo ministros,deram o litro pelo País e só por orgulho não estendem a mão à caridade.
O senhor Rui Pedro Soares, os senhores Penedos pai e filho, que isto da bondade as vezes é hereditário, dúzias deles. Tenham o sentido da realidade,portugueses, sejam gratos, sejam honestos, reconheçam o que eles sofreram, o que sofrem. Uns sacrificados, uns Cristos, que pecado feio, a ingratidão. O senhor Vale e Azevedo, outro santo, bem o exprimiu em Londres. O senhor Carlos Cruz, outro santo, bem o explicou em livros. E nós, por pura maldade, teimamos em não entender. Claro que há povos ainda piores do que o nosso: os islandeses, por exemplo, que se atrevem a meter os beneméritos em tribunal. Pelo menos nesse ponto, vá lá, sobra-nos um resto de humanidade, de respeito. Um pozinho de consideração por almas eleitas, que Deus acolherá decerto, com especial ternura, na amplidão imensa do Seu seio. Já o estou a ver
- Senta-te aqui ao meu lado ó Loureiro
- Senta-te aqui ao meu lado ó Duarte Lima
- Senta-te aqui ao meu lado ó Azevedo que é o mínimo que se pode fazer por esses Padres Américos, pela nossa interminável lista de bem-aventurados, banqueiros, coitadinhos, gestores que o céu lhes dê saúde e boa sorte e demais penitentes de coração puro, espíritos de eleição, seguidores escrupulosos do Evangelho. E com a bandeirinha nacional na lapela, os patriotas, e com a arraia miúda no coração. E melhoram-nos obrigando-nos a sacrifícios purificadores, aproximando-nos dos banquetes de bem-aventuranças da Eternidade.
As empresas fecham, os desempregados aumentam, os impostos crescem, penhoram casas, automóveis, o ar que respiramos e a maltosa incapaz de enxergar a capacidade purificadora destas medidas. Reformas ridículas, ordenados mínimos irrisórios, subsídios de cacaracá? Talvez. Mas passaremos sem dificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos abdicam, por amor ao próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência deste acto dá-me vontade de ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à sua frente indigno de lhes desapertar as correias dos sapatos.
Vale e Azevedo para os Jerónimos, já!
Loureiro para o Panteão já!
Jorge Coelho para o Mosteiro de Alcobaça, já!
Sócrates para a Torre de Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão feia.
Para a Batalha.
Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o Herculano, as criaturas de pacotilha com que os livros de História nos enganaram.
Que o Dia de Camões passe a chamar-se Dia de Armando Vara. Haja sentido das proporções, haja espírito de medida, haja respeito. Estátuas equestres para todos, veneração nacional. Esta mania tacanha deperseguir o senhor Oliveira e Costa: libertem-no.
Esta pouca vergonha contra os poucos que estão presos, os quase nenhuns que estão presos como provou o senhor Vale e Azevedo, como provou o senhor Carlos Cruz, hedionda perseguição pessoal com fins inconfessáveis. Admitam-no. E voltem a pôr o senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado, de onde o obrigaram, por maldade e inveja, a sair.
Quero o senhor Mexia no Terreiro do Paço, no lugar D. José que, aliás, era um pateta. Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no lugar do Marquês de Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos Sindicatos. Acabem com as manifestações, as greves, os protestos, por favor deixem de pecar. Como pedia o doutor João das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E tereis mais fominha e, em consequência, mais Paraíso. Agradeçam este solzinho.
Agradeçam a Linha Branca. Agradeçam a sopa e a peçazita de fruta do jantar.
Abaixo o Bem-Estar.
Vocês falam em crise mas as actrizes das telenovelas continuam a aumentar o peito: onde é que está a crise, então? Não gostam de olhar aquelas generosas abundâncias que uns violadores de sepulturas, com a alcunha de cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não comem carne mas podem comer lábios da grossura de bifes do lombo e transformar as caras das mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval.
Para isso já há dinheiro, não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha, e vocês cartazes, cortejos, berros. Proíbam-se os lamentos injustos. Não se vendem livros? Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e, enquanto vender, o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade, a Academia Francesa. Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os ministros e os ex-ministros a tomarem conta disto.
Sinceramente, sejamos justos, a que mais se pode aspirar? O resto são coisas insignificantes: desemprego, preços a dispararem, não haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias. Como é que ainda sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma forma que os processos importantes em tribunal a indignação há-de, fatalmente, de prescrever. E, magrinhos, magrinhos mas com peitos de litro e beijando-nos uns aos outros com os bifes das bocas seremos, como é nossa obrigação, felizes.
(crónica satírica de António Lobo Antunes, in visão abril 2012)
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