O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

terça-feira, 22 de julho de 2025

Armação de Pêra não merece mais um atentado urbanístico

No final da década de 1970, os terrenos confinantes com o emblemático Hotel Garbe, em Armação de Pêra, foram destinados à construção de mais uma unidade hoteleira. Os proprietários, então donos da histórica Empresa de Viação do Algarve (EVA), sediada em Faro, viam nessa aposta uma forma de integrar o setor dos transportes com o turismo emergente — duas forças em franca expansão no Algarve da época. À luz do contexto socioeconómico daquela altura, a ideia até fazia sentido. O turismo crescia, a costa algarvia começava a ganhar visibilidade internacional e havia espaço — e necessidade — para acolher visitantes. Mas o tempo passou, os paradigmas mudaram e, com eles, as exigências e preocupações da população local também. Hoje, mais de quatro décadas depois, esses mesmos terrenos voltam ao centro do debate. O Plano Diretor Municipal (PDM) de Silves assinala esta zona como um compromisso urbanístico, o que levanta preocupações legítimas sobre a possibilidade de retomar o projeto hoteleiro. Mas será que, em 2025, ainda faz sentido construir mais um hotel naquela área? A resposta parece óbvia para quem vive em Armação de Pêra: não. A zona está já excessivamente densificada, com uma malha urbana apertada, falta crónica de estacionamento, escassos espaços verdes e uma praia sobrelotada durante o verão. A densidade populacional atinge níveis que se aproximam dos de algumas cidades chinesas — um absurdo quando falamos de uma vila costeira que deveria primar pela qualidade de vida, pelo equilíbrio entre residentes e visitantes e pela valorização ambiental. O receio da população aumentou quando, antes do verão, foi vista uma empresa a realizar um levantamento topográfico naqueles terrenos. A associação imediata a um novo projeto de construção foi inevitável. O sentimento de insegurança instalou-se. O que se teme não é o progresso — é a repetição dos erros do passado. Armação de Pêra já sofreu demasiado com um urbanismo desenfreado, feito à margem da sustentabilidade e do interesse público. Os residentes perguntam, com razão: Armação não merece melhor? Não merece um plano urbano que privilegie qualidade de vida em vez de betão? Não merece ver valorizados os seus espaços naturais, o seu património arquitetónico e a sua identidade local? Este não é apenas um debate técnico ou jurídico — é um debate ético. A decisão de permitir (ou não) mais uma construção massiva naquela zona deve ser feita com base naquilo que se quer para o futuro de Armação de Pêra. E esse futuro não pode passar por mais um atentado urbanístico, mascarado de desenvolvimento. Há momentos em que é preciso dizer "basta" e mudar de rumo. Este é um deles.

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