24.11.2014
A detenção do antigo primeiro-ministro
José Sócrates levanta questões de ordem política, de ordem jurídica e de
cidadania. Mais do que a politização da justiça, ela alerta-nos para a judicialização
da política que está em curso no nosso país.
José Sócrates acabou, enquanto
primeiro-ministro, com alguns dos mais chocantes privilégios que havia na
sociedade portuguesa, sobretudo na política e na justiça. Isso valeu-lhe ódios
de morte.
Foi ele quem, por exemplo, impediu o
atual Presidente da República de acumular as pensões de reforma com o
vencimento de presidente. A raiva com que alguns dirigentes sindicais dos
juízes e dos procuradores se referiam ao primeiro-ministro José Sócrates evidenciava
uma coisa: a de que, se um dia, ele caísse nas malhas da justiça iria pagar
caro as suas audácias.
Por isso, tenho muitas dúvidas de que o
antigo primeiro-ministro esteja a ser alvo de um tratamento proporcional e
adequado aos fins constitucionais da justiça num estado civilizado. É mesmo
necessário deter um cidadão, fora de flagrante delito e sem haver perigo de
fuga, para ser interrogado sobre os indícios dos crimes económicos de que é
suspeito?
É mesmo necessário que ele, depois de
detido, esteja um, dois, três ou mais dias a aguardar a realização desse
interrogatório? Dir-me-ão que é assim que todos os cidadãos são tratados pela
justiça. Porém, mesmo que fosse verdade, isso só ampliava o número de vítimas
da humilhação. Mas não é verdade.
Há, em Portugal, cidadãos que nunca
poderão ser humilhados pela justiça como está a ser José Sócrates: os
magistrados. Desde logo porque juízes e procuradores nunca podem ser detidos
fora de flagrante delito.
Em Portugal, poucos, como eu, têm
denunciado a corrupção. Mas, até por isso, pergunto: seria assim tão
escandaloso que um antigo primeiro-ministro de Portugal tivesse garantias
iguais às de um juiz ou de um procurador? Ou será que estes, sim, pertencem a
uma casta de privilegiados acima das leis que implacavelmente aplicam aos
outros cidadãos?
A justiça não é vingança e a vingança
não é justiça. Acredito que um dia, em Portugal, a justiça penal irá ser
administrada sem deixar quaisquer margens para essa terrível suspeita.
Carlos Alexandre - Está há vários anos
no Tribunal Central de Instrução Criminal e por lá ficará o tempo que quiser,
pois os juízes são inamovíveis. Tempos houve em que um juiz não podia
permanecer num tribunal mais do que seis anos (era a regra do sexénio) e, por
isso, recebia um subsídio para a habitação. Porém, desses tempos, só resta,
hoje, o dito subsídio, bem superior, aliás, ao salário mínimo nacional e
totalmente isento de impostos.
Duarte Marques - Este deputado do PSD
veio manifestar publicamente júbilo pela detenção e humilhação pública de
Sócrates, com o célebre ‘aleluia’. Era evitável a primária manifestação de ódio
quando até a ministra da Justiça nos poupou ao habitual oportunismo político.
Talvez mais cedo do que tarde se cumpra a sentença de Ezequiel: "Os
humildes serão exaltados, e os exaltados serão humilhados."
Ler mais em: http://www.cmjornal.xl.pt/opiniao/colunistas/marinho_pinto/detalhe/justica_e_vinganca.html
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