O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

O futuro do turismo está no combate à sazonalidade

Plano para o sector até 2027 aposta no crescimento fora da época alta, no alargamento da actividade a mais regiões do país e na melhoria das qualificações e salários dos trabalhadores do sector.

LUÍS VILLALOBOS 16 de Março de 2017, in Público

O combate à sazonalidade do turismo não surge como principal tópico da nova estratégia para o sector até 2027, mas foi o elemento mais focado pela secretária de Estado do Turismo, Ana Mendes Godinho, na apresentação oficial do documento que decorreu em Lisboa, enquadrado na BTL – Feira Internacional do Turismo.

Só com mais turismo ao longo do ano, sublinhou a secretária de Estado, é possível haver “empregos qualificados e sustentados”, e evitar, por exemplo, que haja despedimentos em massa em Outubro, após a época balnear. O mesmo tema foi abordado pelo presidente do Turismo de Portugal, Luís Araújo, ao falar da sazonalidade como um adversário da empregabilidade.

Numa sala cheia, preenchida por profissionais ligados ao sector, foi depois a vez do ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, destacar a importância do sector para as contas do país, com os dados a saltar à vista: no ano passado, depois de batidos novos recordes, as receitas turísticas chegaram aos 12,7 mil milhões de euros, e o objectivo é que esse valor cresça 7% ao ano, até atingir os 26 mil milhões em 2027 (um cenário mais negativo, com taxas de 5%, leva o montante até aos 20,6 mil milhões).

Aqui, entra em campo a importância da menor sazonalidade, e do alargamento da actividade turística a regiões com pouca procura. É que se os meses de Junho, Junho, Agosto e Setembro são os mais proveitosos, é preciso não esquecer que a maioria das dormidas ocorre junto ao litoral (ou seja, praias, logo, mais propício à sazonalidade), e concentra-se em regiões como Algarve e Lisboa.

Neste caso, a ideia é apostar no património histórico-cultural e natural e ir ajustando a oferta à procura com produtos específicos (por exemplo, com percursos pedestres e de ciclismo). E se pouco há de novo aqui, o objectivo é meritório: alargar a actividade económica e potenciar o número de dormidas para chegar aos 80 milhões (mais 31 milhões dormidas, com um crescimento de 4,2%).

Depois, fazer com que a receita média suba de forma mais expressiva do que as dormidas, ou seja, que cada turista gaste um pouco mais. Aqui, voltamos ao desafio da sazonalidade.

O objectivo é, em dez anos, reduzir o índice que mede a sazonalidade de 37,5% para 33,5%, fazendo assim diminuir o peso da época balnear (em 2005, estava nos 36,8%). Isso faz-se, por exemplo, com eventos como o da Websummit, que se realizou em Novembro do ano passado em Lisboa. Olhando para dos dados do INE referentes aos proveitos em estabelecimentos hoteleiros, verifica-se que, nesse mês, houve em Lisboa um aumento de 32% das receitas face a Novembro de 2015. E é essa, aliás, a ideia do Governo e o Turismo de Portugal, já que parte da estratégia passa por destacar o país enquanto “destino internacional de congressos e eventos culturais e desportivos”, além de reforçar a internacionalização de Portugal “enquanto destino turístico para visitar, investir, viver e estudar”.

Turismo ao longo do ano

Outra parte da estratégia passa por atingir os mercados que melhor se adequam à menor dependência dos meses quentes do Verão. Além do reforço dos mercados estratégicos (como Espanha, Brasil, Irlanda ou os da Escandinávia), pretende-se dinamizar os “mercados de aposta”, como a China, EUA e Índia, os “mercados de crescimento”, como Itália, Suíça, Rússia ou Canadá, e os “mercados de actuação selectiva”, como Japão, Coreia do Sul e países da península arábica.

Com mais dormidas e mais receitas, e turistas ao longo de todo o ano em mais zonas do território, ficaria facilitada a intenção de “aumentar as habilitações da população empregada” no sector. A meta é duplicar o nível das habilitações, passando o peso dos que têm o ensino secundário e pós-secundário dos actuais 30% do total para mais de 60%.

Ao mesmo tempo que se aposta na qualificação, também os salários devem sofrer alterações, para melhor. De acordo com o documento apresentado esta quarta-feira, o rendimento médio anual de um trabalhador na hotelaria e restauração é “cerca de 33% inferior ao do conjunto da economia”.

No seu discurso, a secretária de Estado do Turismo sublinhou o tom positivo ao destacar que, no ano passado, “dois terços do crescimento” do sector em 2016 ocorreram fora da época alta. “Estamos a conseguir trazer mais turistas ao longo do ano”, afirmou, enquadrando a tendência com dados como as novas ligações aéreas e a abertura de unidades hoteleiras (46 no ano passado). E houve até lugar para números frescos: os dados do INE, divulgados esta quarta-feira, deram nota de um novo crescimento, de 12,6%, nas dormidas em Janeiro, com destaque para os estrangeiros (mais 17,6%).

No entanto, há também ameaças e riscos, desde o impacto do “Brexit” a potenciais dificuldades de “afirmação e desenvolvimento do destino Portugal enquanto mercado europeu perante o crescimento da procura por destinos fora da Europa e emergência de novos destinos”, passando pela “possibilidade de sobrecarga turística em determinados locais/destinos”.

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