O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

segunda-feira, 16 de abril de 2018

Governo finlandês ameaça rasgar tratado fiscal com Portugal





Num gesto pouco comum, a Finlândia ameaça rasgar o acordo fiscal que assinou com Portugal em 1971. Em causa está a inércia de António Costa relativamente à revisão das condições do regime fiscal português que cria situações de dupla não tributação: não só dá isenção de IRS aos reformados estrangeiros que se registem em Portugal, como impede os governos estrangeiros de cobrar imposto sobre as pensões que lhes pagam.
O anúncio desta intenção foi feita esta quinta-feira, 12 de Abril e, a avançar, esta seria a primeira vez na sua história que a Finlândia tomaria uma iniciativa desta natureza.

As consequências práticas de uma renúncia ao tratado fiscal dependem da forma como reagir entretanto o governo português: se não fizer nada, cria-se um vazio e, em Janeiro de 2019, cada país passa a aplicar as regras que entender nas relações económicas bilaterais; se entretanto António Costa estugar o passo e fizer aprovar no Parlamento o novo acordo fiscal que já negociou com a Finlândia mas que tarda a libertar, a situação retoma a normalidade. De uma maneira ou de outra, o interesse do regime fiscal português para os finlandeses esvazia-se.

A Finlândia é um dos principais países que nos últimos anos tem assistido à "fuga" de reformados para Portugal. Muitos são figuras notáveis da sociedade que, a troco de aderirem ao regime de residentes não habituais (precisam de dizer que passam cá pelo menos 183 dias por ano e terem cá alguma forma de residência), deixam de pagar IRS na Finlândia sobre as pensões que recebem, e também não pagam IRS cá porque o governo português os isenta.

Esta situação de dupla não tributação decorre de uma brecha das convenções fiscais que estão em vigor, convenções antigas que não previam todo o potencial de criatividade fiscal que brotaria nos Estados europeus.
A convenção da Finlândia data de 1971 e o país foi o primeiro entre os descontentes a pedir a Portugal a sua renegociação, precisamente para tapar estes buracos.
Portugal atrasa novo acordo
Portugal acedeu à renegociação do tratado e fechou acordo em Novembro de 2016, onde se devolve ao governo finlandês a possibilidade de tributar estas pensões no seu território, estancando a perda de receita e a contestação social que a situação tem gerado.

A expectativa dos finlandeses era terem o novo acordo com Portugal pronto a entrar em vigor em Janeiro de 2018 só que o processo esteve a marcar passo no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e ainda não chegou à Assembleia da República.

Em Dezembro de 2017 o Jornal de Negócios já tinha perguntado aos ministérios de Augusto Santos Silva e de Mário Centeno o que justificava estes atrasos, e sobretudo como é que eles se explicavam por comparação com a rapidez com que uma outra convenção com a França tinha entrado em vigor (embora com outros objectivos).

Na altura, o Governo português garantia que "as autoridades dos dois países têm mantido contactos regulares e construtivos sobre esta matéria com o objectivo de evitar potenciais situações de dupla tributação". E os dois ministérios garantiam que "após o habitual processo de análise para aprovação interna, será brevemente submetida à Assembleia da República".
Até agora, contudo, o processo continua a não conhecer desenvolvimentos visíveis, não tendo ainda sido aprovado pelo Parlamento. Quanto mais o processo se atrasasse, mais tarde o governo finlandês recuperaria o direito a tributar os seus reformados que se registaram em Portugal (esvaziando o regime português de interesse).

É a este atraso que o governo finlandês agora reage, como forma de pressão, dizendo que quer renunciar ao acordo assinado em 1971 com Portugal.

Governo finlandês diz que regras são incompatíveis com tributação justa
Contactado pelo Negócios, o ministério das Finanças finlandês remeteu para o comunicado que acaba de divulgar, onde se lê que o tratado que está em vigor com Portugal "é inconsistente com a noção de justiça na tributação das pensões".
Petteri Orpo, ministro das Finanças, diz que a renegociação da convenção com Portugal ocorreu num "espírito de cooperação", mas também lembra que ele está atrasado. Aliás, o comunicado faz questão de sublinhar a diferença de ritmos com que os dois governos trataram a questão: na Finlândia, o processo foi fechado e aprovado no Parlamento em Dezembro de 2016, ao passo que cá ainda nada aconteceu.
"Na Finlândia, o novo tratado foi adoptado tanto pelo Parlamento como pelo Presidente da Republica em Dezembro de 2016 e Portugal foi informado disso", lê-se no comunicado.

Ao mesmo tempo que contactou o ministério das Finanças finlandês, o Negócios também contactou em Portugal o ministério das Finnaças e o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Ao final da tarde, o Ministério das Finanças remeteu a resposta para o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
O MNE, por seu turno, reagiu depois das 20 horas, para descrever os passos processuais que estão em falta.
"Está em curso o processo de ratificação", "de acordo com a lei portuguesa, este processo implica a apresentação de uma Proposta de Resolução pelo Governo à Assembleia da República" e "está em curso a aprovação da referida Proposta de Resolução", respondeu fonte oficial.

O ministério liderado por Augusto Santos Silva não explicou o que justifica os atrasos, nem foi preciso quanto às datas para as referidas aprovações.

O tratado assinado com Portugal é inconsistente com a noção de justiça na tributação das pensões.
Petteri Orpo, ministro das finanças da finlândia


Uma criação socialista abençoada pela direita
O regime de residentes não habituais (RNH) é uma criação socialista (surgiu formalmente em 2009 pela mão de Teixeira dos Santos) entretanto abençoada pelo governo do PSD/CDS (que criou condições à sua expansão), e tem constituído um precioso meio de negócio para os ramos do imobiliário e da consultoria, a par com os "vistos gold".

As benesses são variadas consoante o tipo de rendimentos que estão em causa, mas, no caso das pensões, o regime português oferece zero de IRS a quem vier para cá e se registar como residente não habitual junto do Fisco.

O regime cria logo à partida uma situação de discriminação face aos restantes reformados que vivem em Portugal, mas é do estrangeiro que se têm ouvido as maiores críticas, nomeadamente por parte dos países nórdicos, que acusam Portugal de estar a tirar partido de um vazio legal e ameaçam rever os tratados fiscais com Portugal.

No ano passado, para tentar atenuar o descontentamento dos parceiros europeus, o Governo chegou a equacionar introduzir um IRS mínimo sobre estes pensionistas, como tivemos oportunidade de avançar na altura, mas a medida ficaria pelo caminho.


In: Negócios, por Elisabete Miranda,13 de abril de 2018 às 10:52

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