O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Restauração na ponta da forquilha...

Impostos mais simples


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por Martim Avillez Figueiredo, in “Expresso” de 2/2/2003

Para Portugal entrar na fase de crescimento de que fala Passos Coelho a economia terá de continuar a mudar. Restaurantes ajudam a perceber como tudo se pode passar

Passos Coelho disse esta semana que Portugal “vai passar à fase de crescimento económico”. Boas notícias. Sucede que a retoma só chegará se o esforço de reestruturação da economia continuar. Mantê-lo, porém, força o Governo a um exigente talento político e os portugueses a um continuado pesadelo social. É possível? Restaurantes e cafés são um bom exemplo para olhar o desafio.

Existem em Portugal mais de 80 mil destes estabelecimentos (81.341 para ser exato). Em nenhum outro país da Europa há tantos (medidos pela dimensão da população): em números, um para cada 129 habitantes. Em Espanha, por exemplo, há um para 149 habitantes, ainda muito quando comparado com Itália (188 habitantes por restaurante), França (238), Alemanha (339) ou Reino Unido (442), como se pode ler no estudo da PwC ‘Competitividade e fiscalidade na restauração e hotelaria’. Estes negócios (portugueses) têm em média dois trabalhadores e uma faturação anual de 130 mil euros. A mesma PwC estima que a subida do IVA, somada à retração no consumo, encerrará 30 mil destes estabelecimentos, lançando no desemprego quase 80 mil pessoas.

A primeira ideia que ocorre é: se a retoma chegou, reduza-se então o IVA para que os restaurantes não fechem. Errado. Se o objetivo é reestruturar a economia, então é saudável que ela se torne menos dependente destes negócios - IVA mais alto, portanto, obriga os menos eficientes a ceder o lugar aos mais produtivos, limpando o que não é mais do que desemprego escondido. Isso não implica, porém, que os restaurantes tenham culpa - muito menos as famílias lançadas no desemprego. Solução? Simplificação e agressividade fiscal.

Repare-se: todos ganhariam se muitos cafés e outros pequenos negócios (85% das empresas nacionais) fossem reorientados para sectores produtivos da economia. Com IVA mais alto o Governo consegue que fechem, mas não que se reestruturem. Porém, uma nova tributação fixada a partir de um algoritmo que calcula o valor do espaço ocupado, a taxa de desconto da viabilidade do negócio (quanto mais transacionável, maior o desconto), uma bonificação pela reestruturação (quanto mais pequena a empresa, maior o crédito fiscal) e, claro, a rentabilidade poderia ser a vitamina de incentivos que famílias e país precisam para mudar de vida. Imagine que cada um dos 30 mil restaurantes que a PwC estima fecharem aderia a este modelo, reestruturando-se. Suponha que a nova taxa (IRC alterado, portanto) era de 1000 euros mês (em IVA, hoje, pagam cerca de €2000): 360 milhões de euros de receita, quase tanto como a PwC estima que o Governo perca de receita de IVA depois destes aumentos - o que, agora sim, permitiria corrigir em baixa as taxas de IVA.

Parece conversa fácil. Nunca é: estes raciocínios, aqui simplificados, resultam da convicção de que o processo de ajustamento da economia nacional não se faz apenas sem incentivos a jusante e sem cuidar de que há vidas afetadas no processo. O papel do Governo é procurar caminhos - mas não os caminhos mais fáceis.



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