O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

sábado, 28 de fevereiro de 2015

Este PSD já não me representa

Tenho uma visão personalista da política e da vida que, admito, ter bebido na minha formação cristã. Se por um lado o meu crescimento psicológico e emancipação individual me tornaram um liberal em matéria de costumes e de exercício das liberdades individuais, por outro lado eu nunca deixei de me definir como um católico – não como um ritualista fariseu, mas sim como um personalista, isto é, aquele que tudo subsume, a sua vida, e as suas convicções ao princípio de que acima de tudo está a dignidade da pessoa humana. A eminência da pessoa humana é para mim um dado absoluto em si mesmo. Para mim, a pessoa humana não pode ser encarada como um facto contingente, submetido às políticas, às filosofias ou às regras de conduta. Pelo contrário, estas é que têm de se submeter aquela.

Só depois de ser personalista é que eu sou um liberal. E sendo um liberal eu não sou um libertário. Porque a liberdade para mim está intrinsecamente ligada a um dever ético de responsabilidade. Um libertário acredita que a sua liberdade se basta a si mesma. Um liberal, por outro lado acredita que a liberdade só se justifica enquanto não prejudica a vida dos outros e só se realiza quando os outros também são livres. Um libertário é egoísta. Um liberal é generoso.
E é também derivado da minha formação personalista, e da minha leitura da história e da sociedade portuguesas, que eu me vi a defender a social-democracia como o melhor e mais adequado sistema de organização económica para o meu país. Porque não me consigo dissociar da minha condição de português: se calhar se tivesse outra nacionalidade e vivesse noutra sociedade seria outra coisa. A minha nacionalidade é muito mais do que uma mera circunstância: é um elemento formador da minha personalidade.

Vejo o patriotismo são como algo de saudável e de louvável e vejo os países como a expressão indispensável da organização das comunidades. Só num espaço nacional a Democracia pode subsistir.

Talvez por isto tudo eu não consiga ser um revolucionário, nem um conservador. E me sinta melhor com o reformismo e o gradualismo como métodos. E veja na moderação a melhor abordagem de qualquer liderança.

Por isso estes últimos anos marcaram um afastamento irreversível entre mim e o Partido de que ainda sou militante (o PSD). Sobretudo desde 2010. Não por questões pessoais – talvez até seja a minha ligação a velhas amizades e a uma certa nostalgia de uma parte da minha biografia que me têm impedido um último corte formal e simbólico. Mas em tudo o resto este PSD já não me representa e até se coloca no lado oposto às minhas convicções.

O PSD tornou-se numa coisa estranha. Um corpo estranho à sociedade portuguesa. Uma espécie de cavalgadura dos credores. Uma espécie de milícia da situação. Uma espécie de um braço político de um Regime de Vichy. Abandonou o desígnio da social-democracia ainda que mitigada. Acolheu de braços abertos no seu seio uma visão conservadora e revanchista e revisionista da nossa sociedade para quem o ideal é o regresso a 1973 e que vê estes 40 anos mais como um fracasso do que a redenção de um povo da miséria material e moral.

Medina Carreira, José Gomes Ferreira, João César das Neves, o camelo Lourenço, Paul Ryan e os teóricos austríacos influenciam hoje mais o PSD e os seus dirigentes do que a biografia política de Francisco Sá Carneiro, os ensinamentos do Papa Francisco ou a teoria política de um Russel ou de um Popper.

Mas pior que tudo, o PSD tornou-se algo que nunca tinha sido – um aríete radical. Os valores mais eminentes foram amachucados e amarrotados de forma talvez irreversível. E o modelo vem de cima. De quem lidera. O líder actual do PSD emula cada vez mais um Pierre Laval ressentido e desorientado que à míngua de convicções resume tudo a um só programa: não perder a cara.

Por isso ontem quebrou o último tabu social: admitir que a vida humana tem um preço limite.

A prática dos actuais Gauleiters do PSD de tal forma se despiu de um mínimo de empatia e se deixou contaminar pelo interesse imediato que as suas intervenções cada vez mais parecem ser mais próprias de uma milícia do que de um Partido Político institucionalista e responsável.

Ver Deputados a escrever cartas ridículas a chefes de governo estrangeiros sem nunca terem mexido um dedo perante os colonizadores de Portugal, os mesmos que antes propuseram referendar os direitos humanos de classes específicas de cidadãos em função das suas características pessoais, ou ver um Deputado ontem a dirigir-se a um doente crónico em risco de vida qualificando a sua revolta e o seu desespero como um número de circo, é-me insuportável.

Sim, há gente no PSD que se me tornou repugnante.

E se isto é um problema, nem sequer é o mais grave. Esses pequenos poderosos não me tiram o sono.

O pior mesmo é esta noção cada vez mais evidente que as pessoas comuns deixaram de importar. Que o importante é seguir em frente e não perder a face. Que se justifique sem pudor a catástrofe destes quase 4 anos. Que as pessoas sejam esmagadas pela política e pela economia se preciso for. Nem que se tire sangue a uma pedra.

Este PSD já não é PPD/PSD. É um chicote colectivo. Um instrumento de gestão de carreiras. Um veículo de mediocridade e de imbecis. Um Cavalo de Tróia euro-germânico. Uma quinta coluna. Um sapo feio. Um coelho saltitão. Uma coisa qualquer. Mas já não é o PSD.

Carlos Reis

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