O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Para sair do beco sem saída

Por estranho que pareça ao (des)governo de Portugal, há, felizmente, quem pense coerentemente a salvaguarda de todos os interesses em presença nesta crise financeira e, por via dela, da economia portuguesa...


A conselheira nas instituições europeias propõe estratégia concreta para Portugal recuperar a autonomia financeira e pagar as dívidas
Maria João Rodrigues in "Expresso" de 3.11.12

Estar a ser empurrado para um beco sem saída do empobrecimento e enfraquecimento coletivo é hoje a sensação das esmagadora maioria dos portugueses. Porque aceitam entrar nele? Porque lhes é dito que regressar a condições normais de financiamento do país depende de se alcançar o mais rápido possível a meta dos 2,5% de défice público sobre o PIB.

Para sair deste beco há primeiro que pôr de lado algumas ideias feitas.

A capacidade do país atrair de novo crédito e investimento não depende apenas do nível do défice público, mas da sua capacidade de crescer e valorizar o capital investido.

A meta central para o país não deve assim ser estabelecida apenas em termos de défice, mas em termos da melhor combinação entre défice, dívida e crescimento, devendo este ser claramente positivo.

A meta do défice não deve ser definida em termos nominais, mas em termos estruturais, retirando o efeito do ciclo económico. Um país em recessão profunda deve ser autorizado a uma redução do défice mais lenta, aliás de acordo com o tratado orçamental já ratificado em quase toda a eurozona.

As variáveis-chave da negociação com a UE não são apenas o nível da despesa e da receita públicas, mas sim a taxa de investimento e crescimento e taxa de juro que as condicionam na base.

A melhor forma de manter o Estado social sustentável não é apenas reformá-lo regularmente, é dar-lhe uma base sólida de mais crescimento e de mais população empregada capaz de o sustentar. Fazer essas reformas durante uma recessão profunda e maior carga fiscal, é não só inviabilizá-las mas também aprofundar a recessão.

O que está hoje em causa não é apenas o orçamento público, nem apenas o programa da troika que o enquadra, mas sobretudo a capacidade nacional de definir uma estratégia de crescimento sustentável e de influenciar um quadro europeu que a suporte.

O nosso interlocutor externo principal não deve ser a troika, que é uma mera equipa que age no quadro instruções gerais, mas antes o topo do sistema político que lhe dá essas instruções gerais.

Com base nestes novos pressupostos, a mensagem do país para o topo do sistema político europeu e internacional não deve ser apenas que estamos a conseguir o défice externo e o défice público e que, prosseguindo esta via, vamos certamente recuperar a autonomia financeira e pagar as nossas dívidas. Deve antes ser:

Estamos a fazer um esforço intenso para corrigir os nossos problemas: aumentar a capacidade de exportação, tornar o Estado mais eficaz, cortar despesa desnecessária, melhorar e compensar o mérito profissional. Mas este esforço está também a produzir efeitos muito negativos: subida do desemprego e da pobreza sem precedentes, emigração em grande escala, incluindo de jovens qualificados.

Apresentamos este alerta: se este tipo de trajetória for prosseguida sem mais, estes efeitos vão agravar-se ainda mais, colocando uma parte importante da população ao nível da sobrevivência.

Temos uma estratégia melhor para revitalizar a atividade económica e manter a coesão social, fazendo também uma redução consistente do défice e da dívida em relação ao PIB.

Estas são as áreas onde temos competência acumulada para crescer e esta é a carteira de projetos que preparámos. Estes são os cortes de despesa pública e as alterações fiscais que podemos fazer sem destruir empresas e empregos viáveis e sem pôr em causa a rede de proteção de que as pessoas precisam.

Para tudo isto ser viável precisamos de condições de financiamento mais razoáveis, combinando de forma dinâmica os novos instrumentos disponíveis: FEEF, MEE, BCE, BEI e a atual construção de uma união bancária. Esta é uma peça central da reforma mais geral da UEM que está em curso, em que tencionamos participar ativamente para assegurar que ela respeitará o princípio de convergência - nos défices, mas também no crescimento e nas taxas de juro - sem os quais a integração europeia não poderá superar a crise atual.

Esta mensagem será entendida.


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