O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Se deves 100, o problema é teu! Se deves 1000 o problema é daquele a quem tu deves!

O percurso da União Europeia é complexo e tem sido caracterizado por avanços determinados bem como por hesitações paralisantes. Tem-se falado de uma Europa a duas velocidades, mas, bem vistas as coisas, temos tido é uma marcha a várias velocidades.

Se ontem assistimos a uma reacção politica a 27, face à crise financeira, que não demovendo os eurocépticos, gera esperança fundada nos que acreditam no projecto europeu, até antes de ontem, o impasse politico que impediu uma resposta à altura, em uníssono, a esta crise de laboratório, sustentou o eurocepticismo e desesperou todos os que se sentem europeus.

A resposta em sintonia tardou e com o seu atraso a situação grave em que se encontravam todos os países em situação periclitante, piorou...ameaçando o bem que se pretende salvaguardar com tanta prudência e masturbação das pequenas politicas nacionais.

As hesitações dos responsáveis, são típicas dos financeiros e a lógica da sua prudência é bancária. As mesmas que, de resto, colocaram a economias no estado de crise em que se encontram.

Há quem diga que urge que o poder “económico” volte a balizar-se pelo domínio “politico”. Ou por outras palavras, que o poder politico tem de voltar a sobrepor-se ao económico.
Se há conclusão racional a retirar desta crise e da resposta à mesma, esta é uma das evidentes e certeiras.

Outro dia um comentarista recordava que quando o Chanceler Kohl se empenhou na reunião das Alemanhas, ou pela criação do euro, esteve contra largas correntes de opinião, internas e externas, e, sem curar de saber das consequências eleitorais das suas opções, não deixou de levar por diante as politicas em que acreditava piamente.

A história recente demonstra que homens políticos daquele quilate, são raros em qualquer parte e também na Europa!

Tem-se falado ultimamente com frequência dos abusos do Estado social na Grécia. Abusos de natureza idêntica, em maior ou menor grau, poder-se-iam apontar na realidade portuguesa, irlandesa, italiana ou espanhola. Fala-se também em contraponto do rigor dos alemães na gestão da sua riqueza e sobretudo na contenção da sua distribuição social, designadamente em sede do direito à reforma e da idade para atingí-lo por parte dos seus cidadãos-trabalhadores.

Daí que, as opiniões públicas dos países mais ricos não estarão dispostas a pagar as diatribes dos mal comportados.

Daqui se tem partido igualmente, de forma leviana e superficial, para a conclusão de que os países em maiores dificuldades deveriam sair do euro. Ou, da nuance mais recente, que a Alemanha, eventualmente na companhia de outros países realmente ricos do norte, deveria sair do euro, o que redundaria, mais ou menos na mesma coisa para os outros.

Dizem uns que essa situação permitiria a esses países desvalorizar a moeda e resolver a crise em 2 ou 3 anos.

Ora, se Portugal e outros países saíssem do euro, teriam que criar uma nova moeda, retomando o escudo, que teria automaticamente um valor muito mais baixo que o euro, ou o seu actual contravalor em escudos. Por exemplo, um dia depois de nos creditarem na conta bancária 200 escudos por cada euro, teríamos de pagar 500 escudos para obter um euro.

Tendo estes países uma balança de pagamentos deficitária, importando mais do que exportam, os custos de produção dos produtos a exportar seria realmente mais baixo o que ajudava a competitividade. No entanto as importações de matérias-primas e produtos semi acabados seriam adquiridas em euros e, ou dólares, anulando significativamente essa aparente vantagem.

Quanto aos produtos no mercado interno manter-se-iam, se se mantivessem, no mesmo nível de preço mas como o dinheiro disponível das famílias se reduziria em resultado da “desvalorização “ da nova moeda o custo de vida aumentararia exponencialmente o que conduziria ao agravamento das condições determinantes do desemprego e da pobreza das populações.

Finalmente como a dívida externa se manteria em euros, diminuiriam as hipóteses da economia ser capaz de gerar riqueza para pagá-la.

Um verdadeiro desastre!

Mas, quanto á questão da indisponibilidade das opiniões públicas dos países ricos para pagar as dívidas dos outros, é um facto e é por essa razão que a UE tem agido de forma errática e vacilante agravando a situação em lugar de resolvê-la.

No entanto a questão é sobretudo emocional e não económica. Tem a ver com a necessidade da eleição de Sarkozy e Merkel e não com as realidades económicas. Senão vejamos:
É certo que a globalização em geral e a UE com a sua moeda única, criaram interdependências que têm que ser consideradas.

Mas, imaginemos que os países alvos dos mercados sairiam da moeda única: Portugal, Espanha, Grécia Irlanda, Bélgica e Itália...

O conjunto destes países soma quase 1/3 da UE, em termos de habitantes e um pouco mais em termos de PIB, uma vez que a Itália é a 3ª economia da zona euro e uma das 7 mais ricas do mundo, apesar de ter uma dívida externa das maiores do mundo.

Se estes países entrassem em incumprimento e saíssem do euro o que aconteceria, por exemplo á Alemanha?
- A Alemanha é a maior credora destes países e os seus bancos possuem no seu Balanço uma exposição enorme às dívidas destes países. Se considerarmos apenas as ajudas já efectuadas a Portugal, Grécia e Irlanda, já temos uma pequena fortuna de 80 mil milhões em Portugal, 230 mil milhões na Grécia e Irlanda 70 mil milhões.

É portanto de admitir que os bancos alemães deixassem de cumprir os rácios Tier 1 o que conduziria á inevitável intervenção do Orçamento de Estado alemão injectando capital nos bancos para manter a sua solvabilidade.

Esta operação aumentaria o défice público e o endividamento externo do país!

- A Alemanha é um dos maiores exportadores mundiais (cremos que o 3º mundial).
Mais de 60% do PIB alemão é gerado pelas exportações, sendo a maior percentagem realizada para os países da UE e para os EEUU.

O colapso financeiro destes países conduziria a uma descida brusca do consumo das populações, mesmo sem as previsíveis barreiras alfandegárias, e, deste modo a uma redução drástica das exportações da Alemanha afectando seriamente o crescimento económico.

- Finalmente, a saída destes países levaria a uma nova média do valor do euro com imediata e inevitável valorização do euro e, por esta via, á deterioração da competitividade do país e na sua capacidade de exportação, criando mais uma redução acelerada do seu crescimento económico, dada a dependência no PIB das exportações.

Claro que isto é verdade, não só para a Alemanha, mas também para todos os outros países que se mantivessem na zona euro.

E o que aconteceria ao BCE?

Como sabemos, o BCE actuou no mercado comprando a dívida pública destes países tendo uma enorme exposição no seu balanço já que em muitos casos, como Portugal, foi durante meses a única fonte de financiamento para as bancas dos países em dificuldades, sendo esses empréstimos garantidos pelos títulos da dívida pública que após o incumprimento deixariam de ter valor e causariam um rombo enorme no Balanço e nos activos do BCE, conduzindo á necessidade dos países ricos recapitalizarem o banco com as consequências negativas nos seus défices orçamentais e no aumento do endividamento externo.

Hoje mais que nunca, encontramo-nos perante a evidência de um antigo ditado judaico:
Se deves 100, o problema é teu! Se deves 1000 o problema é daquele a quem tu deves!

O orçamento alemão e o bancos alemães estão expostos da forma que estão porque financiaram indirectamente (através dos países importadores) a sua indústria, fazendo-a ainda mais poderosa e com ela um pais ainda mais rico. Mas curiosamente, mais dependente da saúde financeira dos seus clientes.

Será que ainda ninguém traduziu para o alemão esta lógica elementar de sua autoria?

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