O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Vender o Algarve para pagar a dívida?



O Governo não é dono disto. Apenas administra temporariamente a coisa pública em prol do bem comum. Em tempos de aperto toma naturalmente poderes de excepção. Mas mesmo na emergência deve ter consciência daquilo que não lhe compete. Não basta ter permissão e vantagem. É preciso bom senso para saber que há coisas que ultrapassam a conjuntura. Como os feriados.

O anterior Governo, aquele que levou o País à beira da ruína, achou-se com direito a mudar coisas básicas da sociedade, simplesmente por ter maioria ocasional. Enquanto tratava mal daquilo que lhe competia, atrevia-se a mexer no que tinha o dever de respeitar. Porque a definição de casamento e os limites da vida não podem estar ao sabor de coligações de momento.

O modelo original de núpcias da Lei n.º 9/2010 de 31 de Maio deve-se a um conjunto de deputados que achou que uma simples votação, sem referendo, quase sem consulta e discussão, pode alterar um dado básico da civilização. No caso do aborto (Lei 16/ /2007 de 17 de Abril) ao menos houve referendo, mas seguido de fraude. Porque a pergunta a sufrágio era sobre a despenalização, mas o Governo sentiu-se com poder para estabelecer a liberalização e subsidiação do aborto. Para perceber a diferença, era como se a descriminalização do consumo de drogas aprovada há 11 anos (Lei n.º 30/2000 de 29 Novembro) implicasse a distribuição de heroína barata pelo Estado. Espantoso que esta supina desonestidade política não só tenha vingado, mas seja a única coisa intocável pelos cortes na Saúde do actual Governo.

Os extremos a que chegou o Executivo Sócrates são difíceis de igualar, porque ainda seria preciso referir a promoção do divórcio (Lei n.º 61/2008 de 31 de Outubro), manipulação de embriões (Lei 32/06, de 26 de Julho), etc. Mas o actual Governo, no meio das medidas duras da troika, já exorbita das suas funções quando se pensa com direito a mexer nos feriados.

As celebrações comunitárias que temos, com raízes culturais profundas, não são exageradas nem exigem reforma. Aliás o Governo não apresenta nenhuma razão específica para as alterações que pretende. Vai mudar os feriados, não por causa de problemas dos feriados, mas simplesmente para as pessoas trabalharem mais. Ora se a questão é laboral, lide-se com ela em termos laborais. Mexa-se no horário de trabalho ou cortem-se dias de férias, mas não se toque naquilo que recebemos em herança e que temos de deixar aos que nos sucederem. Será que também vamos cortar o hino para acelerar as cerimónias ou vender o Algarve para pagar dívida?

Os limites da política
por JOÃO CÉSAR DAS NEVES in DN de 7/11/2011

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