O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

sábado, 9 de março de 2013

Ter sido(realmente) ajudado foi bom! Ajudar nem tanto!


Joseph Stiglitz* no “Expresso” Economia, de 9.03.2013

NOVA IORQUE - O resultado das eleições italianas deveria enviar uma mensagem clara aos líderes da Europa: as políticas de austeridade que têm seguido estão a ser rejeitadas pelos eleitores.

O projeto europeu, por mais idealista que tenha sido, foi sempre um esforço do topo para a base. Mas outro assunto completamente diferente é encorajar os tecnocratas a governar países, aparentemente contornando os processos democráticos, e impondo-lhes políticas que conduzam à miséria pública generalizada.

Embora os líderes da Europa fujam ao termo, a realidade é que grande parte da União Europeia se encontra em depressão. A queda na produção em Itália desde o início da crise é apenas comparável à da década de 1930. A taxa de desemprego entre os jovens na Grécia ultrapassa agora os 60%, e a da Espanha está acima dos 50%. Com a destruição do capital humano, o tecido social da Europa desintegra-se, e o seu futuro é posto em perigo.

Os médicos da economia dizem que o doente deve manter-se neste caminho. Os líderes políticos que sugerem outra solução são catalogados de populistas. A realidade, porém, é que a cura não funciona, e não há esperança que vá funcionar - isto é, sem ser pior do que a doença. De facto, levará uma década ou mais para que se recuperem das perdas inerentes ao processo de austeridade.

Em resumo, não foi o populismo nem a falta de visão que conduziram os cidadãos a rejeitar as políticas que lhes foram impostas. Foi o entendimento de que estas políticas estão profundamente erradas.

Os talentos e recursos da Europa - o seu capital físico, humano e natural - são hoje os mesmos que eram antes do início da crise. O problema é que as receitas impostas estão a conduzir a uma subutilização maciça destes recursos. Qualquer que seja o problema da Europa, uma resposta que acarrete um desperdício desta dimensão não pode ser aceite como solução.

O diagnóstico simplista dos males da Europa - que os países em crise viviam acima das suas possibilidades - está nitidamente errado, pelo menos em parte. Espanha e Irlanda tinham excedentes orçamentais e reduzidos rácios dívida/PIB antes da crise. Se a Grécia fosse o único problema, a Europa poderia facilmente ter lidado com ele.

Um conjunto alternativo de políticas bem discutidas poderia funcionar. A Europa precisa de mais federalismo fiscal, e não apenas de uma vigilância centralizada dos orçamentos nacionais. Na verdade, a Europa pode não precisar do rácio de dois para um entre os gastos federais e estaduais que os Estados Unidos apresentam; mas precisa claramente de mais despesa ao nível europeu, ao contrário do atual minúsculo orçamento da UE (ainda mais diminuído pelos defensores da austeridade).

Também é necessária uma união bancária. Mas precisa de ser uma união real, com uma garantia comum de depósitos e procedimentos partilhados para resolução de disputas, além de uma supervisão comum. Também deverão existir eurobonds, ou um instrumento equivalente.

Os líderes europeus reconhecem que, sem crescimento, o fardo da dívida irá continuar a crescer, e que a austeridade por si só é uma estratégia contrária ao crescimento. No entanto os anos passam, e nenhuma estratégia de crescimento está em cima da mesa, apesar dos seus componentes serem bem conhecidos: políticas que enfrentem os desequilíbrios internos da Europa e o enorme excedente comercial da Alemanha, que ombreia agora com o da China (e é mais do que duas vezes maior em relação ao PIB). Especificamente, isso significa o aumento de salários na Alemanha e políticas industriais que promovam a exportação e a produtividade nas economias periféricas da Europa.

O que não funcionará, pelo menos para a maioria dos países da zona euro, é a desvalorização interna - ou seja, forçar a descida de salários e preços - já que isto aumentaria o fardo da dívida para as famílias, empresas e governos (que são detentores, na sua esmagadora maioria, de dívidas tituladas em euros). E, com ajustes a ocorrer em diferentes sectores a diferentes velocidades, a deflação provocaria importantes distorções na economia.

Se a desvalorização interna fosse a solução, o padrão-ouro não teria constituído um problema durante a Grande Depressão. A desvalorização interna, combinada com austeridade e o princípio do mercado único (que facilita a saída de capital e a hemorragia dos sistemas bancários) constitui uma combinação tóxica.

O projeto europeu foi, e é, uma grande ideia política. Tem o potencial de promover simultaneamente a prosperidade e a paz. Mas, ao invés de melhorar a solidariedade no seio da Europa, está a semear a discórdia dentro dos países e entre os países.

Os líderes europeus trocam repetidamente votos para fazer tudo o que seja necessário para salvar o euro. A promessa do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, de fazer “o que for preciso” conseguiu alcançar uma acalmia temporária. Mas a Alemanha tem rejeitado, de modo consistente, todas as políticas que poderiam constituir uma solução de longo prazo. Os alemães, parece, farão tudo exceto o que é necessário.

Claro, os alemães têm vindo relutantemente a aceitar a necessidade de uma união bancária que inclua uma garantia comum de depósitos. Mas o ritmo a que concordam com reformas desse género está desfasado em relação aos mercados. Os sistemas bancários de diversos países estão já em suporte básico de vida. Quantos mais estarão nos cuidados intensivos até que a união bancária seja uma realidade?

Sim, a Europa precisa de uma reforma estrutural, como insistem os defensores da austeridade. Mas será a reforma estrutural dos acordos institucionais da zona euro, e não as reformas no seio dos países, a que causará o maior impacto. A não ser que a Europa esteja disposta a encetar essas reformas, poderá ter que deixar morrer o euro para se salvar a si própria.

A União Económica e Monetária da UE foi um meio para atingir um fim, e não um fim em si mesma. O eleitorado europeu parece ter reconhecido que, no quadro dos acordos atuais, o euro está a minar os mesmos propósitos para os quais foi supostamente criado. É essa a verdade simples que os líderes europeus ainda têm que entender.

Traduzido do inglês por António Chagas

*Laureado com o Nobel da Economia, é Professor na Universidade de Columbia.


4 comentários:

Anónimo disse...

O que tem isto a ver com Armação?

Põe-te a pau disse...

Sempre há gente muito distraida. Então a crise não está já em armação? E a malta sem dinheiro vai acorrer a armação no mesmo numero?
E se não vierem os turistas o senhor anónimo vai comer o quê?
Não perdeu uma boa ocasião para estar calado? diga lá, sinceramente?

Um cego que quer ver disse...

O senhor anónimo é mesmo toino. Acha que em armação tudo fica na mesma se esta crise continuar nesta direcção?
Começe a pensar em dedicar-se à pesca e à agricultura seriamente, caso contrário emigre, que foi tudo o que o seu avô fez.

Comissão para o Nobel da Estupidez disse...

Seria bom o blog conceder o Nobel da estupidez ao anónimo das 9,54.
O que acham?

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