UMA CIDADANIA PARTICIPATIVA não se cansa – necessáriamente – de denunciar causas e consequências do estado da nação.
Se é certo que a legitimação do poder politico se faz pelo voto, não é menos certo que a credibilidade só se conquista pelo exemplo.
Numa sociedade como a portuguesa, caracterizada por défices democráticos profundos, sobretudo em sede de cidadania activa e participação, a pedagogia do exemplo não fez ou faz escola.
Muitas das medidas hoje elogiadas ao Governo, pela “coragem” demonstrada, não passam de reparações de erros antigos, muitos deles gerados voluntariamente, pela classe politica que têm monopolizado o exercício do poder democrático: o Partido Social Democrata e o Partido Socialista.
Naturalmente que, independentemente da origem dos erros, as terapias para os mesmos são sempre bem vindas. E urgentes…
Não podemos é deixar de chamar os “bois pelos nomes”, sob pena de promiscuidade com o poder politico e sobretudo com a sua leviandade histórica.
E NÃO DEVEMOS DEIXAR DE O FAZER, não só por dever cidadania, mas também por sermos, inelutávelmente, os destinatários das suas irresponsabilidades, incompetências e desperdício.
Pois, quanto maiores forem estes desmandos, maiores são as necessidades de e da Receita. E, por via disso mesmo, todos nós passamos hoje “as passas do Algarve”, na mira dos exércitos da Administração Fiscal, “em pé-de-guerra” pela conquista da Receita.
Não da Receita necessária a uma administração eficiente, e à Despesa virtuosa do investimento, mas a Receita imposta pelo malbaratar dos recursos, através de uma gestão displicente e politicamente (no sentido partidário) interesseira, ao longo de três décadas.
Aplaudir o Governo por uma administração correcta, neste contexto, é mais ou menos o mesmo que aplaudir o Vitória de Setúbal por não descer de divisão.
Sem prejuízo, naturalmente e uma vez mais, de serem bem vindas todas as boas medidas que nos afastem deste atoleiro.
REFERIMO-NOS AINDA HOJE, ao desemprego!
Até há muito poucos anos a taxa de desemprego em Portugal manteve – se inferior aos níveis elevados que caracterizavam os seus parceiros europeus. Pensávamos que era uma situação sustentável e por isso fomos adiando as mudanças necessárias.
Tal cenário foi possível, em primeiro lugar pela especialização produtiva em actividades de trabalho intensivo que trilhamos logo a seguir ao 25 de Abril, fruto da desvalorização cambial, cujo primeiro impacte positivo se reflectiu na indústria têxtil e de vestuário, as quais, com a adesão à UE se libertaram da contingentação de exportações, progredindo.
Um segundo empurrão deveu-se à enorme expansão do sector da construção cujo peso no emprego praticamente duplicou, devido ao investimento em infra-estruturas, seguido do investimento residencial após a adesão ao euro.
Por fim mas não por último, o engordar do sector público, terceiro factor para o aumento do emprego e o primeiro para justificar o défice orçamental cuja tentativa de cobertura nos deprime, oprime e empobrece.
Entretanto hoje o governo queixa-se como se a responsabilidade da contratação pública fosse d’algum extraterrestre…
Adormecemos á sombra da bananeira uma vez que, os factores que permitiram esse bom resultado aparente eram, em si mesmos, insustentáveis, o que era bem conhecido de qualquer governante medianamente informado, como, legitimamente, qualquer cidadão esperava.
O que foi facto foi que os governantes que tivemos, de enorme, grande, médiia ou pequena dimensão, não conceberam nem empreenderam as mudanças capazes de substituir tais factores quando se esgotassem sendo certo que a sua morte se encontrava mais que anunciada.
Por outro lado, a integração europeia e a globalização à porta, impunham a reconversão rápida. Qualquer “guru” da economia o proclamava em pasquins de meia-tigela. A nossa governação porém continuou a coçar o umbigo e, dada a sua suprema competência recusou-se a ver a secção internacional dos jornais e do telejornal.
O grande esforço em matéria de educação e formação profissional que se impunha, bem como a criação de um clima empresarial e laboral competitivo e aberto ao exterior, estiveram presentes no barroco dos discursos eleitorais, é certo. E grave!
Mas mais grave ainda foi o facto das lideranças políticas, não só não terem querido assumir os custos da necessidade de mudança, como ainda terem transmitindo sinais contrários ao conjunto dos cidadãos.
A educação e a formação profissional foram encarados de forma leviana e preguiçosa. Despenderam-se muitos milhões de euros sem se notar retorno.
(E estou mesmo em crer que, ajudando, não foram só os “jeeps dos agricultores” que os esgotaram…pois, independentemente de constituírem um bom exemplo do desperdíco na oportunidade, os fundos dispendidos com os mesmos foram utilizados. O mesmo não podemos dizer da enorme quantidade de milhões que estiveram à disposição do Pais e que foram devolvidos por falta de utilização.)
E daqueles que foram utilizados, os interesses instalados souberam manobrar os orçamentos a seu belo prazer tirando daí benefícios que não foram estendidos a toda a sociedade, sendo certo que os diversos governos que os geriram dispunham dos poderes necessários a fazê-lo melhor.
São conhecidos os milhões utilizados em formação profissional de qualidade muito duvidosa, a qual foi exclusivamente instrumentalizada para beneficiar as estatísticas do emprego e por conseguinte as evidências do sucesso das politicas de emprego dos governos que as seguiram.
Se a sociedade empresarial, cuja omissão na utilização destes fundos é-lhe imputável, em muitos casos renegou a tais benefícios apenas para não estar sujeita ao estigma das perseguições fiscais persecutórias, devoluções de fundos inerentes, ou por não ter condições para suportar os custos da burocracia na obtenção de tais meios. Um mimo…
Por outro lado o Estado, que em última análise poderia ter investido na formação intensa dos seus funcionários na busca da eficiência, para poupar mais tarde, pouco ou nada fez. Hoje insiste nos inevitáveis despedimentos, continuando a esquecer a eficiência que não tem, por exclusiva falta de formação competente de grande parte dos seus funcionários.
Entretanto, na educação, mantemos a maior taxa de abandono escolar, enquanto a preocupação dos nossos jovens é ter um diploma e o satus que a sociedade lhe atribui. Não propriamente, as competências que o sistema educativo deveria proporcionar.
O rendimento perdido pelo facto de se prolongarem os estudos não é compensado pelo ganho adicional em empregabilidade ou salário decorrente dessa decisão.
ENFIM, nesta matéria “cada cavadela é uma minhoca”!
Sabemos que o Primeiro-Ministro não pode ser responsabilizado por administrações nas quais não participou ou nas quais não teve a principal responsabilidade.Mas o senhor Primeiro-Ministro também sabe que o que nos conduziu aqui foi toda a sorte de irresponsabilidades, incompetências e demissões, da classe dirigente a que pertence desde há muito. Esperemos que saiba que nós também o sabemos. E sobretudo que se não esqueça disso!