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Aquilo que define um governo (ou estadista) diferenciado, em qualquer momento da história, e para que fique na história, é a sua capacidade de antecipação das questões que marcarão o seu futuro e das suas comunidades, que, conhecendo as características estruturais da realidade que gere, mobilize os meios de as converter, adequando as circunstâncias por forma a preparar as respostas às realidades que se antevêem.
A ÁGUA, para mal dos nossos pecados, é um tema cheio de futuro nos “telejornais” e um bem cuja posse determinará a politica internacional, tanto ou mais que o petróleo até hoje.
É neste contexto que “enquadramos” a atenção que o Governo espanhol começou (???) a dispensar ao assunto.
Com efeito, o público espanhol em particular e também o Europeu em geral, foram surpreendidos pela notícia de que o Governo espanhol pretendia “nacionalizar” a água estando em seguida disposto a fazer concessões por períodos temporais diversos aos privados que poderão utilizar a sua exploração sustentada, mediante adequada retribuição ao Estado.
Este conceito é baseado na premissa de que a água constitui um bem público e que a todos pertence, incumbindo por conseguinte ao Estado, que a todos representa, ter uma palavra determinante a dizer e, naturalmente, uma compensação financeira correspondente.
Na realidade, o negócio da àgua mobiliza capitais e empresas transnacionais, não raramente ligadas a estados, confundindo ou podendo confundir-se a sua gestão com interesses mais amplos daqueles.
Importará assim, pelos vistos e pelo menos ao Governo espanhol, não ver-se conformado um dia, a ver um bem essencial à comunidade espanhola, gerido à distância em consonância com interesses mais ou menos claros de um outro estado não compagináveis com os seus próprios.
Tanto mais assim é que, nós Portugueses, conhecemos suficientemente, a gestão miudinha que, em matéria de àguas, os nossos vizinhos tem feito para partilharem connosco o activo àgua (a questão dos rios, Douro e Guadiana) ou a gestão de mãos largas para nos oferecerem de bandeja e conscientemente o crude do navio que naufragou nas costas da Galiza, arrastando-o para que as correntes se encarregassem de transportar a ruína ao mar atlântico das nossas costas, minimizando o desastre na costa Galega.
PASSANDO EM REVISTA A IMPRENSA, merecem registo duas correntes de opinião sobre o assunto:
- Por um lado, os neo-liberais, para os quais qualquer intervenção ou mesmo, pelos vistos, a própria existência do Estado, lhes cria “pele de galinha”!
Obviamente defendem que este plano não tem qualquer razão de ser já que o Estado não deve ser protagonista na vida económica, relegando-lhe o papel de criar as condições para o investimento privado e a sua sacro-santa capacidade de “multiplicar os peixes”, único capaz do desenvolvimento.
- Por outro lado, aqueles que, cépticos da ética do poder, entendem que este plano é apenas mais um, tendente a “esmifrar” o cidadão, não lhe conferindo grande credibilidade.
Em consciência, não podemos criticar os segundos pois, é bem de ver que, o “modus operandi” dos Estados em geral, não tem ajudado os cidadãos a acreditar que as suas politicas visam cumprir a sua parte do contrato (no sentido de J.J. Rousseaux, em: Le Contract Social) e portanto esta seria mais uma estratégia tendente a alargar a receita do orçamento de estado que permita perpetuar a manutenção das condições de exploração do estado pela classe politica e quejandos.
Parece-nos porém útil debruçarmo-nos sobre o mérito da causa deixando depois uma apreciação casuística sobre o que pensamos da intenção do Governo Espanhol.
A água é realmente um bem escasso que importa gerir preventivamente!
Bastará dizer que 97% (noventa e sete por cento) da água disponível no planeta encontra-se nos oceanos (portanto não bebível sem tratamento prévio e muito oneroso)!
Dos restantes 3% (três por cento), 2% (dois por cento) vêm das calotes e dos glaciares e, apenas 1% (um por cento), das nascentes terrestres.
Desde logo se compreendem as controvérsias que hoje já existem por causa da água (mesmo o conflito israelo-palestiniano tem uma componente de luta pela água) e, que portanto vai sendo altura de nos preocuparmos não só com o petróleo, o qual sustenta um paradigma de desenvolvimento esgotado, mas também com a água que sustenta a existência humana e é vital a qualquer sistema de desenvolvimento.
Parece-nos, por conseguinte que um bem tão raro como a água, a qual constitui, em bom rigor, património de todos, seja da propriedade do estado que a todos representa, por todas as razões, sendo a mais importante, tratar-se de um bem vital a todas as formas de vida, por ser potenciador de conflitos violentos entre a Humanidade e, finalmente, por vir a ser generalizadamente um perigoso instrumento de poder que poderá colocar em causa as independências nacionais .
ESTA CONCEPÇÃO é na nossa opinião extensível a outros bens públicos como o mar, os rios e mesmo as florestas, de entre outros.
Temos presenciado, mais ou menos impávidos, as enormidades que se têm feito por colocar à frente dos interesses do planeta – maxime do Homem em harmonia com todas as formas de vida- os interesses económicos e financeiros, quer sejam dirigidos pelos interesses públicos quer pelos interesses privados.
Não se pode criticar a iniciativa privada pelo resultado da suas actividades empresariais – o lucro ou o crescimento -, única razão da sua existência, devidamente “socializada” pelo emprego e pela carga fiscal inerente.
O mesmo não se pode afirmar dos poderes públicos, os quais só existem na medida e no interesse das comunidades, não raro rendidos à mesma lógica típica deste sistema de desenvolvimento caduco, potenciando a aparentemente inexorável marcha da destruição do planeta, das espécies e da harmonia dos mesmos.
Aos Estados compete por conseguinte não só deterem a propriedade destes bens públicos que a todos pertencem, mas também estabelecerem as regras impostas aos privados para a sua exploração sustentada, prudente e preventiva da escassez.
O mesmo se diga dos interesses transnacionais que as empresas poderão prosseguir, contrários aos interesses das comunidades, cuja identificação, minimização ou anulação compete aos mesmos.
Parece-nos portanto de saudar as medidas percursoras previstas pelo Governo espanhol e sobretudo a sua pedagogia nesta matéria, demonstrando a consciência do valor vital do bem àgua, da necessidade de assegurar a sua titularidade em ordem a uma gestão criteriosa e prudente face ao interesse geral que constitui e á escassez que se antevê, com tudo o que habitualmente lhe anda associado .
CONHECEMOS TODOS BEM O DILETANTISMO com que os poderes central e local em Portugal tratam certos interesses públicos, sobre os quais, face à evidência do mesmo, dispensamo-nos de mais comentários.
O mesmo não podemos fazer quando falamos de interesses vitais, como a gestão da àgua…
Não podemos tolerar que estes interesses sejam subalternizados em face das questiúnculas dos pequenos poderes, dos feudos, das vaidades esvaziadas de conteúdo, dos novos-riquismos culturais e politicos, das politicas dos corsos e fontanários, do financiamento dos partidos, enfim da ausência dos valores na vida politica, da promoção dos desvalores a valores, paradigma dos serventuários do poder, de que são únicos titulares os cidadãos-contribuintes. Exclusivamente!
Os cidadãos-contribuintes exigem que o exemplo pedagógico espanhol surta efeito e que os poderes central e local ponderem seriamente sobre medidas de igual alcance em Portugal, sem concessões a neo-liberalismos ou estatismos imobilistas, displicentes e despesistas, no interesse exclusivo da comunidade nacional e da tutela dos seus interesses vitais!
5 comentários:
Bem vindo J.J.J., estranhei a sua ausência.Bom texto!
Tenho sentido muito a sua falta no seu blogue e no meu.Brilhante texto,como habitualmente.É uma questão central para o nosso futuro e irei anunciar propostas neste quadro.Obrigado.António Carneiro Jacinto.
Agradeçemos sinceramente as palavras de estimulo.
Ao A. Carneiro Jacinto pedimos que aguarde a conclusão de um "estudo" que estamos a terminar sobre certas despesas do Concelho!
Um modesto contributo para a causa!
Até lá!
bla bla bla.................
Querem é que o Estado tome conta de tudo!
A água a quem a usa, deve vir ai mais uma taxa!
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