O défice de participação da sociedade civil portuguesa é o primeiro responsável pelo "estado da nação". A política, economia e cultura oficiais são essencialmente caracterizadas pelos estigmas de uma classe restrita e pouco representativa das reais motivações, interesses e carências da sociedade real, e assim continuarão enquanto a sociedade civil, por omissão, o permitir. Este "sítio" pretendendo estimular a participação da sociedade civil, embora restrito no tema "Armação de Pêra", tem uma abrangência e vocação nacionais, pelo que constitui, pela sua própria natureza, uma visita aos males gerais que determinaram e determinam o nosso destino comum.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

O PROFESSOR MARCELO NÃO VAI PASSAR O FIM DO ANO AO BRASIL... "Vêm para Armação de Pera"...

Nas suas homílias dominicais, Marcelo Rebelo de Sousa disserta com profunda sabedoria e total independência sobre este, aquele e o outro; e sobre isto, aquilo e aqueloutro. No passado fim-de-semana resolveu voltar a perorar sobre o caso BES e escolheu como alvo José Maria Ricciardi. Saiu-se mal.

O mais importante não é o desmentido de Ricciardi às duas afirmações taxativas de Marcelo: que o BESI (a que Ricciardi presidia) avalizou a emissão e colocação de papel comercial do GES e que o banqueiro não se afastou do conselho de administração do BES nem de administrador da ESI quando constatou que havia sérios problemas que se estavam a verificar nestas entidades e após ter entrado em rutura com Ricardo Salgado. Marcelo, ao contrário da aura que muitos lhe atribuem, engana-se com frequência sobre assuntos que não domina, em particular os económicos, fazendo com grande leveza afirmações mais próprias das revistas de coração sopradas pelos seus amigos mais chegados, sem dar oportunidade aos atingidos de fornecerem a sua versão. É, por isso, mais que provável que nos dois casos em apreço seja Ricciardi a ter razão.

Uma coisa é muito provável: o Professor Marcelo este ano não vai passar o fim do ano ao Brasil a casa do dr. Salgado e provavelmente no próximo Verão também não vai fazer um lindo cruzeiro pelo Mediterrâneo com a família Salgado
O que é manifestamente interessante é a farpa que o banqueiro lhe atira, a propósito das «habituais e luxuosas férias de fim do ano na mansão» de Ricardo Salgado à beira-mar no Brasil, coisa que era desconhecida da generalidade da opinião pública e que devia levar Marcelo a ser mais ponderado nas posições que toma no caso BES – ou a não tomar, como é o caso de Miguel Sousa Tavares, que por ter uma filha casada com o filho de Salgado evita dissertar sobre o tema. Marcelo não só não diz nada sobre as férias no Brasil, como não diz sobre as férias no Mediterrâneo num barco alugado por Ricardo Salgado, como não diz que a sua mulher trabalhava há muito diretamente com Salgado. Mas entretanto não se coibiu de ir perorando e perorando e perorando sobre o caso BES, criticando este, aquele e aqueloutro, mas tendo sempre um enorme cuidado nas palavras que escolhe para dirigir a Ricardo Salgado.

Já agora, se o Professor Marcelo é incontinente verbal, devia ser a TVI, que tem responsabilidades editoriais, a sugerir-lhe que não abordasse a questão do BES nos seus comentários dominicais, dando aos espetadores uma explicação sobre essa decisão. Mas nem o Professor Marcelo se cala, nem a TVI evita o tema.

Uma coisa é muito provável: o Professor Marcelo este ano não vai passar o fim do ano ao Brasil a casa do dr. Salgado e provavelmente no próximo Verão também não vai fazer um lindo cruzeiro pelo Mediterrâneo com a família Salgado. Estas implosões de bancos e grupos a que se está ligado por múltiplas cumplicidades são muito maçadoras.

Nicolau Santos, Expresso Diário, 15/12/2014

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