segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Biscates...

Para que servem as primeiras páginas dos jornais e os grandes casos dos noticiários das TV?
Se pensarmos no que as primeiras páginas e as aberturas dos telejornais nos disseram enquanto decorriam as traficâncias que iriam dar origem aos casos do BPN, do BPP, dos submarinos, das PPP, dos SWAPs, da dívida, e agora do Espírito Santo, é fácil concluir que servem para nos tourear.
Desde 2008 que as primeiras páginas dos Correios das Manhas, os telejornais das Moura Guedes, os comentários dos Medinas Carreiras, dos Gomes Ferreiras, dos Camilos Lourenços, dos assessores do Presidente da República, dos assessores e boys dos gabinetes dos ministros, dos jornalistas de investigação, nos andam a falar de tudo e mais alguma coisa, excepto das grandes vigarices, aquelas que, de facto, colocam em causa o governo das nossas vidas, da nossa sociedade, os nossos empregos, os nossos salários, as nossas pensões, o futuro dos nossos filhos e dos nossos netos. Que me lembre, falaram do caso Freeport, do caso do exame de inglês de Sócrates, da casa da mãe do Sócrates, do tio do Sócrates, do primo do Sócrates que foi treinar artes marciais para a China, enfim, que o Sócrates se estava a abotoar com umas massas que davam para passar um ano em Paris… mas nem uma página sobre os Espirito Santo! É claro que é importante saber se um primeiro ministro é merecedor de confiança, mas também é, julgo, importante saber se os “Donos Disto Tudo” o são. E, quanto a estes, nem uma palavra. O máximo que sei é que alguns passam férias na Comporta a brincar aos pobrezinhos. Eu, que sei tudo do Freeport, não sei nada da Rioforte! E esta minha informação, num caso, e falta dela, noutro, não pode ser fruto do acaso. Os directores de informação são responsáveis pela decisão de saber uma e desconhecer outra.
Os jornais, os jornalistas, andaram a tourear o público que compra jornais e que vê telejornais.
Em vez de directores de informação e jornalistas, temos novilheiros, bandarilheiros, apoderados e moços de estoques: em vez de notícias temos chicuelinas.
Não tenho nenhuma confiança no espirito de autocritica dos jornalistas que dirigem e condicionam o meu acesso à informação: todos eles aparecerão com uma cara à José Alberto de Carvalho, à Rodrigues dos Santos, à Guedes de Carvalho, à Judite de Sousa (entre tantos outros) a dar as mesmas notícias sobre os gravíssimos casos da sucata, dos apelos ao consenso do venerando chefe de Estado, do desempenho das exportações, dos engarrafamentos do IC 19, das notas a matemática, do roubo das máquinas multibanco, da vinda de um “rebenta-canelas” uzebeque para o ataque do Paiolense de Cima, dos enjoos de uma “apresentadeira” de TV ou das tiradas filosóficas da Teresa Guilherme. Todos continuarão a acenar-me com um pano diante dos olhos para eu não ver o que se passa onde se decide tudo o que me diz respeito.
Tenho a máxima confiança no profissionalismo dos directores de informação e que eles continuarão a fazer o que melhor sabem: tourear-nos. Abanar-nos diante dos olhos uma falsa ameaça para nos fazerem investir contra ela enquanto alguém nos espeta umas farpas no cachaço e os “empresários” arrecadam o dinheiro do respeitável público.
Não temos comunicação social: temos quadrilhas de toureiros; uns a pé, outros a cavalo.
Uma primeira página de um jornal é, hoje em dia e após o silêncio sobre os Espirito Santo, um passe de peito.
Uma segunda página será uma sorte de bandarilhas.
Um editor é um embolador, um tipo que enfia umas peúgas de couro nos cornos do touro para a marrada não doer.
Um director de informação é um “inteligente” que dirige uma corrida.
Quando uma estação de televisão convida um Camilo Lourenço, um Proença de Carvalho, um Gomes Ferreira, um João Duque, um Gomes Ferreira, um Júdice, um Marcelo, um Miguel Sousa Tavares ou um Ângelo Correia, devia anunciá-los como um grupo de forcados: Os Amadores do Espirito Santo, por exemplo. Eles pegam-nos sempre e imobilizam-nos: caem-nos literalmente em cima.
As primeiras páginas do Correio da Manhã podiam começar por uma introdução diária: para não falarmos de toiros mansos nem de toureiros manhosos, temos as habituais notícias de José Sócrates, do memorando da troika, dos cortes, da imperiosa necessidade de pagar as nossas dividas…
Todos os programas de comentário político nas TV deviam começar com a música de um passo doble.
O silêncio que os “negócios“ da família dona disto tudo mereceu da comunicação social - tão exigente noutros casos - é um atestado de cumplicidade: uns venderam-se, outros queriam ser como os Espirito Santo. Em termos tauromáticos, na melhor das hipóteses não temos jornalistas, mas moços de estoques. Na pior, temos as redacções cheias de vacas a que chamam, na gíria, as “chocas”.
O que o silêncio cúmplice, deliberadamente cúmplice, feito sobre o caso Espirito Santo, o que a técnica do desvio de atenções revela é que temos uma comunicação social avacalhada, que não merece grande confiança.
Quando um jornal ou uma TV dão uma notícia na primeira página sobre Sócrates (e falo dele porque a comunicação social montou sobre ele um operação de barragem, que na altura se justificou com o direito a sabermos o que se passava com quem nos governava e se esqueceu de nos informar sobre quem se governava) ficamos agora a saber que esteve a fazer como o toureiro, a abanar-nos um trapo diante dos olhos para nos enganar com ele e a esconder as suas verdadeiras intenções: dar-nos uma estocada fatal!
Porque será que comentadores e seus patrões, tão lestos a opinar sobre pensões de reforma, TSU, competitividade, despedimentos, aumentos de impostos, gente tão distinta como Miguel Júdice, Proença de Carvalho, Ângelo Correia, Soares dos Santos, Ulrich, Maria João Avilez e esposo Vanzeller, não aparecem agora a dar a cara pelos amigos Espirito Santo?
Porque será que os jornais e as televisões não os chamam, agora que acabou o campeonato da bola?
Um grande Olé aos que estão agachados nas trincheiras, atrás dos burladeros!

Por Carlos de Matos Gomes

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