Com pedido de publicação recebemos o texto que se segue:
"O que vem escrito abaixo é de leitura obrigatória uma vez espelha bem o que se passa no Portugal de hoje, dirigido (?) por uma cáfila de meninos, comandados a partir de Belém por um Sr. que acabou com quase tudo o que de produtivo Portugal tinha, que beneficiou da batota provocada por aqueles que, hoje em liberdade, nos obrigam a pagar os seus roubos, e que, paulatinamente mas sem decoro, nos vão subtraindo aquilo que nós, com o nosso trabalho, conseguimos amealhar ao longo de uma vida...
"O que vem escrito abaixo é de leitura obrigatória uma vez espelha bem o que se passa no Portugal de hoje, dirigido (?) por uma cáfila de meninos, comandados a partir de Belém por um Sr. que acabou com quase tudo o que de produtivo Portugal tinha, que beneficiou da batota provocada por aqueles que, hoje em liberdade, nos obrigam a pagar os seus roubos, e que, paulatinamente mas sem decoro, nos vão subtraindo aquilo que nós, com o nosso trabalho, conseguimos amealhar ao longo de uma vida...
Tudo isto vem a
propósito do prémio atribuído a Alexandra Lucas Coelho pela Associação
Portuguesa de Escritores (APE), na sala 2 da Fundação Gulbenkian, em 7 de
Abril, onde em representação do presidente da República esteve presente o
Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier.
Alexandra Lucas Coelho
Não há gravações do que se
passou durante a entrega do Grande Prémio de Romance e Novela da APE, na sala 2
da Fundação Gulbenkian, a 7 de Abril. Havia jornalistas presentes mas não em
trabalho, a tomar notas. Por isso não há forma de citar ipsis verbis o
que disse o Secretário de Estado da Cultura (SEC), Jorge Barreto Xavier. Mas há
algumas dezenas de testemunhas que podem acrescentar ou corrigir o que vou
tentar resumir agora aqui, por tudo se ter passado numa cerimónia pública.
Sendo este prémio
tradicionalmente entregue pelo Presidente da República, decidiu o actual
presidente, Cavaco Silva, à semelhança de anos anteriores, fazer-se
representar. Neste caso, pelo seu Consultor para Assuntos Culturais, Diogo
Pires Aurélio. Isto era o que eu sabia quando escrevi o discurso para a
ocasião.
Já no átrio da Gulbenkian,
perto da hora marcada, 18h, a APE comunicou-me que a cerimónia estava um pouco
atrasada porque esperavam o Secretário de Estado da Cultura.
Quando Barreto Xavier
chegou e entrámos todos para a sala, o protocolo sentou-o ao centro da mesa,
junto a Diogo Pires Aurélio. Nas pontas, Gulbenkian (representada por Rui
Vieira Nery), APE (José Manuel Mendes, José Correia Tavares), júri
(representado por Isabel Cristina Rodrigues) e eu. Vieira Nery abriu,
sucintamente; seguiram-se discursos da APE; Isabel Cristina Rodrigues leu o
texto em que o júri justifica a atribuição do prémio a "E a Noite
Roda". Diogo Pires Aurélio e eu levantámo-nos para que ele me entregasse o
sobrescrito do prémio, um minuto de formalidade, sem palavras, para a
fotografia. Chegou a minha vez de discursar, li as páginas que trazia. No fim,
houve uma ovação de pé. Digo isto para dar conta da atmosfera que os
representantes do poder político tinham diante de si.
A APE convidou então o SEC a
intervir. Ele escolheu falar sentado, sem se deslocar ao púlpito. Uma das
coisas que disse, na parte, digamos, cultural da intervenção, foi que eu bem
podia declarar que não fazia ficção porque claro que fazia ficção porque é isso
que um escritor faz, ficção. Foi o primeiro arroubo dirigista, que nos devia
ter preparado para o que aí vinha.
Na parte, digamos, política,
destaco quatro coisas: o SEC disse que eu devia estar grata por estarmos em
democracia e eu poder dizer o que dissera; que durante anos os portugueses se
tinham endividado acima das suas possibilidades; que, ao contrário do que eu
dissera, ninguém saíra de Portugal por incentivo deste governo; e, sobretudo,
que eu tinha dito que não devia nada a este governo mas que isso não era
verdade porque este governo também subsidiava o prémio.
Referia-se ele, assim, a um
prémio com décadas de existência; atribuído a alguns dos mais extraordinários
escritores de língua portuguesa; cujo montante em dinheiro resulta de vários
patrocínios, sendo que os públicos resultam do dinheiro dos contribuintes; e
que tem atravessado os mais variados governos, sem que nunca, que me recorde,
algum governante o tenha tentado instrumentalizar. Foi a mais escancarada
confusão de Estado com Governo que já presenciei, para além do tom chantagista
ao nível de jardim de infância das ditaduras. E, apesar dos apupos, de quem lhe
gritava da plateia "Mentira!" e "O Estado somos nós!", o
SEC insistia.
Como cabe ao Presidente da
República, ou seu representante, encerrar a cerimónia, a APE instou Diogo Pires
Aurélio a falar. O representante do Presidente da República declinou e encerrou
a sessão. No fim, cumprimentou cordatamente todos os presentes na mesa e
retirou-se.
Já Barreto Xavier, aproximou-se
de mim na confusão da retirada. Julguei que se vinha despedir, depois de dizer
o que tinha a dizer. Nada disso. Queria dizer-me, visivelmente irritado, que o
que eu fizera tinha sido de um grande "primarismo". Respondi-lhe que
então devia ter dito isso mesmo ao microfone, que eu já dissera o que tinha a
dizer e não lhe ia dizer mais nada. Fui andando, para contornar a mesa e acabar
com a cena, mas o SEC insistia: que eu tinha sido “primária”.
O Público pediu-me o discurso
para publicar online na tarde do dia 8. Quatro horas depois, 89 mil pessoas
tinham lido o texto. Ontem, o post no FB do "Público" tinha
sido visto por 170 mil. Obrigada a todos pela partilha.
O que disse então a escritora Alexandra Lucas Coelho :
O meu país não é do
orgulhosamente só. Não sei o que seja amar a pátria. Sei que amar Portugal é
voltar do mundo e descer ao Alentejo, com o prazer de poder estar ali porque se
quer. Amar Portugal é estar em Portugal porque se quer. Poder estar em Portugal
apesar de o Governo nos mandar embora. Contrariar quem nos manda embora como se
fosse senhor da casa. Eu gostava de dizer ao actual Presidente da República,
aqui representado hoje, que este país não é seu, nem do Governo do seu partido.
É do arquitecto Álvaro Siza, do cientista Sobrinho Simões, do ensaísta Eugénio
Lisboa, de todas as vozes que me foram chegando, ao longo destes anos no
Brasil, dando conta do pesadelo que o Governo de Portugal se tornou: Siza
dizendo que há a sensação de viver de novo em ditadura, Sobrinho Simões dizendo
que este Governo rebentou com tudo o que fora construído na investigação,
Eugénio Lisboa, aos 82 anos, falando da “total anestesia das antenas sociais ou
simplesmente humanas, que caracterizam aqueles grandes políticos e estadistas
que a História não confina a míseras notas de pé de página”.
Este país é dos bolseiros da FCT que viram
tudo interrompido; dos milhões de desempregados ou trabalhadores precários; dos
novos emigrantes que vi chegarem ao Brasil, a mais bem formada geração de
sempre, para darem tudo a outro país; dos muitos leitores que me foram
escrevendo nestes três anos e meio de Brasil a perguntar que conselhos podia eu
dar ao filho, à filha, ao amigo, que pensavam emigrar. Eu estava no Brasil,
para onde ninguém me tinha mandado, quando um membro do seu Governo disse
aquela coisa escandalosa, pois que os professores emigrassem. Ir para o mundo
por nossa vontade é tão essencial como não ir para o mundo porque não temos
alternativa. Este país é de todos esses, os que partem porque querem, os que
partem porque aqui se sentem a morrer, e levam um país melhor com eles, forte,
bonito, inventivo. Conheci-os, estão lá no Rio de Janeiro, a fazerem mais pela
imagem de Portugal, mais pela relação Portugal-Brasil do que qualquer discurso
oco dos políticos que neste momento nos governam. Contra o cliché do português,
o português do inho e do ito, o Portugal do apoucamento. Estão lá, revirando a
história do avesso, contra todo o mal que ela deixou, desde a colonização, da
escravatura.
Este país é do Changuito, que em 2008
fundou uma livraria de poesia em Lisboa, e depois a levou para o Rio de Janeiro
sem qualquer ajuda pública, e acartou 7000 livros, uma tonelada, para um 11.º
andar, que era o que dava para pagar de aluguer, e depois os acartou de volta
para casa, por tudo ter ficado demasiado caro. Este país é dele, que nunca se
sentaria na mesma sala que o actual Presidente da República.
E é de quem faz arte apesar do mercado, de
quem luta para que haja cinema, de quem não cruzou os braços quando o Governo
no poder estava a acabar com o cinema em Portugal. Eu ouvi realizadores e
produtores portugueses numa conferência de imprensa no Festival do Rio de
Janeiro contarem aos jornalistas presentes como 2012 ia ser o ano sem cinema em
Portugal. Eu fui vendo, à distância, autores, escritores, artistas sem dinheiro
para pagarem dívidas à Segurança Social, luz, água, renda de casa. E tanta
gente esquecida. E, ainda assim, de cada vez que eu chegava, Lisboa parecia-me
pujante, as pessoas juntavam-se, inventavam, aos altos e baixos.
Não devo nada ao Governo português no
poder. Mas devo muito aos poetas, aos agricultores, ao Rui Horta, que levou o
mundo para Montemor-o-Novo, à Bárbara Bulhosa, que fez a editora em que todos
nós, seus autores, queremos estar, em cumplicidade e entrega, num mercado cada
vez mais hostil, com margens canibais.
Os actuais governantes podem achar que o
trabalho deles não é ouvir isto, mas o trabalho deles não é outro se não ouvir
isto. Foi para ouvir isto, o que as pessoas têm a dizer, que foram eleitos,
embora não por mim. Cargo público não é prémio, é compromisso. Portugal talvez
não viva 100 anos, talvez o planeta não viva 100 anos, tudo corre para acabar,
sabemos. Mas enquanto isso estamos vivos, não somos sobreviventes.
Este romance também é sobre
Gaza. Quando me falam no terrorismo palestiniano confundindo tudo, Al-Qaeda e Resistência
pela nossa casa, pela terra dos nossos antepassados, pelo direito a estarmos
vivos, eu pergunto o que faria se tivesse filhos e vivesse em 40km por seis a
dez de largura, e antes de mim os meus antecedentes, e depois mim os meus
filhos, sem fim à vista. Partilhei com os meus amigos em Gaza bombardeamentos,
faltas de água, de luz, de provisões, os pesadelos das meninas à noite. Depois
de eu partir a vida deles continuou. E continua enquanto aqui estamos. Mais um
dia roubado à morte."
Mais um artigo de extrema importancia na denuncia do que se passa nas "antecamaras" do sistema Democrático Português, onde um Presidente de Republica condecora um marginal reconhecido com a Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique, Valentim Loureiro, e a uma cerimónia deste indole, manda um assesor e deixa que um secretário de estado eleito pelo povo se arrogue a afrontar o povo com as barbaridas que aqui se podem ler.
ResponderEliminarE de novo a constatactação que a este sitio de cidadania, este assuntos pouco ou nada interessa ao ponto de estimular qualquer participação.
Pobre Nação