sexta-feira, 5 de abril de 2013

“HIPOCRISIA, FISCALIDADE, ASTERIX E... AS PME’S”


Pessoalmente, considero a hipocrisia a característica de personalidade menos tolerável, tão baixo que é o limiar da sua metamorfose de virtude em defeito.

Há, contudo, uma forma muito usual de se manifestar nestas tribunas: doutrinar, catequizar sobre consequências sem análise de causas, em clara violação da sabedoria do filósofo chinês Confúcio quando estipulou “Não pretendo conhecer todas as  respostas mas, tento compreender as perguntas...”.
“Mas o que tem isto a ver com a evasão fiscal?”, questionará o leitor.
Ora, é exactamente aqui que entra Asterix.!!...

Quando Ordalfabetix e Cetautomatix, conterrâneos de Asterix e respectivamente, peixeiro e ferreiro na aldeia dos celebérrimos irredutíveis gauleses, se aperceberam do interesse na construção em comum duma ponte sobre o riacho que os separava da floresta, predispuseram-se, voluntária e aprioristicamente, a materializar  a sua contribuição para a construção da mesma; Quando, mais tarde, Asterix e Obelix a quiseram utilizar nas suas caçadas de javalis, entenderam normal a sua contribuição aposteriorística para a ponte: o pagamento da taxa que então lhes foi solicitada.

Até que, um dia, a aldeia soçobra; O exército romano exige o tributo dos conquistadores, a contribuição para o financiamento da Via Apia, ao que os Gauleses retorquem: “Mas, porquê?... Nunca lá iremos passar!!...”
César respondeu, secamente: “Porque sim... E, ficais sabendo: tal vos é imposto!!...”

Depois, a estória já é conhecida: o humanismo conceptualizou a redistribuição inter-pessoal de riqueza, o “estado-providência” agilizou a redistribuição inter-temporal do rendimento... E, pronto, aí está o IMPOSTO como entidade referencial da sociedade moderna! Para uns, bactéria, vírus; Para outros, elixir de juventude...

... Do que não restam dúvidas é que, a partir do momento em que o Estado começa a sentir a necessidade de justificação do processo de colecta, o cidadão começa a pressentir a utilidade da formulação da questão “Para onde é que vai o meu dinheiro...” ... Daí que, hoje por hoje, a motivação básica da evasão fiscal não seja, em minha opinião, a da propensão excessiva à ilegalidade decorrente duma certa sensação de impunidade, ou a demissão da contribuição para o bem comum ou, sequer, a irresponsabilidade da não ponderação do próprio futuro...

A questão central é mesmo: até que ponto é que o rendimento que hoje é retido está a ser bem administrado, até que ponto é que o valor a redistribuir não estará a ser destruído por um Estado despesista no consumo, laxista no investimento, ineficaz na gestão e ineficiente na produção de bens e serviços públicos...
Não pretendo, desta forma, forçar a lógica de “preço dum serviço” no conceito de Imposto; Mas questiono frontalmente a qualidade do Estado que temos no processo de redistribuição inter-pessoal e/ou inter-temporal do rendimento!!... É aí que se deve colocar a questão: “Para que servem os impostos??...” !!...
Questão à qual o psicólogo laociano Phiouphanh Ngaosyvathn respondeu desassombradamente:
“A fraude está para o imposto como a sombra está para o homem...” (1).

Então, qual o espanto, num país ensolarado como Portugal, com défices profundos de cidadania e participação, exemplos abundantes de despesa pública exorbitante malbaratada, legislação fiscal a que os mais respeitáveis cidadãos apodam de terror fiscal, se menos de 40% das PME’s pagam impostos independentemente da sua rendibilidade real, seja esta positiva ou até negativa?

Quando o processo de redistribuição de riqueza se manifesta injusto e não evidencia sinais de regeneração o que esperar, lucidamente, do contribuinte? 

O engajamento, senão mesmo cumplicidade dos cidadãos-contribuintes nos elevados propósitos de um Estado Social que administra eficientemente os tributos que recolhe proporcionadamente da riqueza gerada por uma economia sã ou a obediência que o Rei Absoluto exige ao súbdito e a sua inevitável resistência?


 Paulo Modesto Pardal in blogdoprofpaulomodestopardal.blogspot.com



(1) in “Role de l’Impot” (Vol. II), Ed. Montchrestien, 1998.

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