Entrou hoje em vigor a Lei n.º 3/2010, de 27 de Abril que veio estabelecer a obrigatoriedade de pagamento de juros de mora pelo Estado pelo atraso no cumprimento de qualquer obrigação pecuniária.
O quadro legislativo até agora em vigor já previa o pagamento de juros de mora por parte do Estado, mas, aplicava-se só aos contratos. A partir de hoje os juros são aplicáveis independentemente da fonte.
Quando os contratos não discriminem um prazo para a concretização do pagamento pelo serviço prestado ao Estado é aplicado o período de 30 dias fixado na legislação. As entidades podem estabelecer um prazo de até 60 dias. Se entenderem estipular um prazo mais alargado, terão de apresentar uma justificação objectiva. À falta dessa explicação, o prazo é considerado nulo e são aplicados os mesmos 30 dias que a lei prevê.
Esta medida naquilo que se prevê vir a ser o seu resultado, aparentemente gravoso para o erário público, revela uma intenção salutar ao inculcar um outro realismo na relações dos particulares com o Estado.
Todos sabemos, porque já lemos e ouvimos dizer, que o Estado, muitas vezes é mau pagador, não por não ter condições financeiras para proceder ao pagamento das suas obrigações no respectivo vencimento, mas pelas dificuldades internas que revela nos extensos processamentos administrativos que conduzem à “emissão do cheque”.
A máquina administrativa é pesada na generalidade das suas instâncias e por conseguinte extraordinariamente lenta.
Quem se prejudica com esta velocidade de caracol são todos aqueles que fornecem o Estado, em geral empresas privadas.
Por outro lado, aquelas mesmas, quando no papel de devedoras ao Estado, deparam-se, pelo contrário, com uma máquina rápida, eficiente e triturante, na cobrança dos seus créditos que não renuncia a um avo dos juros que a lei lhe confere.
Por isso dizemos que o Estado é um monstro com duas cabeças, uma para pagar e outra para receber.
Mas pela mesma razão pudemos sempre dizer que tal dualidade de critérios é imoral.
Na verdade, o Estado, que continua a ser uma alavanca excepcional para a economia privada, tem beneficiado, do ponto de vista financeiro, com esta lentidão e tem, do mesmo prisma, prejudicado grandemente a economia privada que tantas vezes tem de se endividar e suportar custos financeiros enormes para cumprir com as suas obrigações perante o Estado atempadamente.
Muitas vezes o contribuinte tem de entregar impostos que ainda não recebeu e algumas vezes que nunca irá receber.
Tudo a bem das contribuições devidas a um Estado que, sendo social, supostamente as aplica no interesse da comunidade com eficiência.
Não é assim, infelizmente. Nem sempre as aplica bem e pouca vezes com eficiência.
Razões pela quais esta medida parece ser um verdadeiro hara-kiri!
Então se o Estado anda com tantas dificuldades financeiras, agora vai, por sua própria iniciativa, agravá-las com a obrigação generalizada do pagamento de juros de mora?
Ouvimos um dia um grande constitucionalista dizer que o Estado, tem de descer do altar e colocar-se no meio de nós comunidade, onde pertence.
Esta medida, sem qualquer dúvida, milita neste sentido. Mas não só.
O pagamento dos juros de mora aos seus fornecedores, em pé de igualdade com estes quando em situação de devedores àquele, constitui, por outro lado, uma estimulante medida de equidade no tratamento de situações iguais, um bom exemplo da iniciativa daquele a quem é imposto ser pessoa de bem e exemplar.
É por isso um passo importante para conquistar, justificadamente, a confiança dos cidadãos, que aliás deveria ser uma das suas principais obrigações. Não é suficiente, mas por aqui, para lá pode caminhar...
Depois ainda, introduz uma dose de “real” absolutamente imprescindível ao aparelho de Estado.
A ineficiência vai passar a ter um custo mais.
Até aqui a ineficiência do aparelho de estado já tinha e tem custos elevadíssimos para a economia e seus agentes como é sabido. Agora, vai passar a ter também para o orçamente geral do Estado, pois os atrasos vão custar caro.
Por fim, aquela que nos parece ter sido a causa imediata desta medida:
A ineficiência do aparelho de Estado e, sobretudo, dos seus agentes, vai passar a ser medido em euros!
Sabendo nós que o Estado tem sido um verdadeiro albergue espanhol onde a classe politica tem, com o emprego, pago toda a sorte de favores aos apaniguados, encontra-se sobrelotado, em situação de sobre emprego, o qual é responsável pela verba mais pesada do orçamento geral do estado, a qual com os restantes custos sociais, representa 70 ou 80% da despesa e 100% da receita dos impostos que pagamos.
O Governo, este ou outro qualquer, sabe que não irá colocar o défice onde tem de colocar, sem mexer na principal verba do lado da despesa, isto é, com os funcionários, reduzindo o seu número.
Fácil se torna concluir que, infligindo, por virtude da ineficiência dos serviços, uma penalização no OGE, essa penalização vai passar a ter responsáveis. Com o dano sofrido e com os responsáveis identificados, os procedimentos disciplinares serão muito mais frequentes e o objectivo de reduzir funcionários facilitado.
Claro que tudo isto ao nível da administração central, no caso da local as coisas vão-se agravar, necessariamente. Vejamos o caso do nosso concelho:
O prazo médio de pagamento da Câmara de Silves aos seus fornecedores é actualmente muito superior aos 30 dias agora estipulados.
Cerca de seis meses em média é o prazo que os fornecedores têm que esperar para verem a cor do seu dinheiro.
Mas já foi pior, estamos recordados que até há muito pouco tempo esses mesmos fornecedores tinham que esperar cerca de 15 meses.
No contexto deplorável do nosso orçamento municipal, esta lei vai, desde logo agravar significativamente a sua situação económica e financeira, uma vez que, sem qualquer obra mais, vai ver-se aumentado pelo lado despesa, grosso modo em mais 10%.
Daqui terão de vir a resultar alterações profundas no campo da despesa municipal, o que constitui objectivamente um golpe sério no futuro da politica de folclore e inaugurações em que assenta o sucesso de muitos autarcas.
Hoje mesmo responsáveis pela gestão dos municípios, já fizeram saber que, na sua interpretação da lei, a obrigação do pagamento de juros de mora só é aplicável a contratos firmados a partir de 1 de Setembro, certamente será também esta a interpretação de Isabel Soares.
Mas ainda que assim seja, em nada altera o raciocinio do legislador e os seus objectivos.
Veremos...
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